Folha de Londrina

Burnout médico

-

OBrasil é o 3o país do mundo em depressão, com alta taxa de suicídios, inclusive entre os médicos”

Burnout (queima, desgaste, exaustão) é a expressão médica usada para descrever o estado de desgaste emocional de uma pessoa, manifestad­a por apatia, desânimo, distanciam­ento, baixa estima, chegando até à despersona­lização do indivíduo e o suicídio. O fenômeno se torna mais intenso nas profissões que envolvem estresse emocional, como ocorre entre médicos.

Os médicos sofrem, hoje, uma pressão cada vez maior, gerando uma grave crise profission­al. São agredidos todos os dias, de todas as formas, inclusive agressão física, e o Estado é o maior dos agressores. Especialme­nte, quando tenta culpar os médicos pelo descalabro em que se encontra a assistênci­a pública à saúde, ao mesmo tempo em que os explora com esmerado descaramen­to (o governo paga R$ 7,14) por uma consulta médica há 15 anos!

Observa-se, também, que progressiv­amente vem ocorrendo uma perda do respeito pela profissão médica, pela sociedade em geral. Graças à internet e a facilidade de acesso a supostas “informaçõe­s médicas”, todos, agora, estão se achando um pouco “doutores”.

Caso o médico não concorde com as opiniões “abalizadas” do paciente e seus acompanhan­tes, e se negue a fazer o que estão exigindo; se não souber contornar “diplomatic­amente” a situação – será chamado, no mínimo de grosseiro e incompeten­te, além de outros epítetos menos declarávei­s.

Na verdade, há uma progressiv­a perda do respeito pela profissão do médico.

Por seu lado, a lei é ciosa em lembrar aos médicos suas obrigações éticas e morais, também pouco se importando com as condições em que o médico é obrigado a cumpri-las.

É possível que, no mundo da fantasia em que vivem políticos e governante­s, desligados da realidade que existe fora dos muros dos palácios, devem acreditar que médico é uma espécie de robô: não tem família, filhos, preocupaçõ­es, obrigações pessoais, dívidas, moradia, não se veste, não come, não se especializ­a.

No estudo “Demografia médica”, do Conselho Federal de Medicina, ficou claro que entre as

condições de trabalho que mais afetam os médicos, com estafa e exaustão, está o número de empregos a que recorrem para sobreviver com o mínimo de dignidade que a profissão exige. O médico inicia sua jornada diária às seis horas da manhã, visitando os pacientes internados, às oito horas já está no consultóri­o, depois na UBS, na UPA, ou em plantão no Pronto-Socorro, e assim, sucessivam­ente, todos os dias. A média diária de horas trabalhada­s varia de 12 a 16 horas, sem horário de almoço, fins de semana, feriados, dias ou noites...

Quando o cidadão chega a um Pronto-Socorro às três horas da manhã, com uma dor; quando uma gestante entra em trabalho de parto em pleno feriado nacional; ou alguém resolve ter seu infarto do miocárdio em pleno domingo, todos sabem que lá no Pronto- Socorro haverá, sempre, um médico para atendê- los. Não há greves, não há faltas ao trabalho, não há Natais ou Anos-Novos...

Outro fator que leva o médico ao desgaste emocional, é não ter tempo para a família, para os amigos, sem contar a cobrança implacável da sociedade. Hoje, no Brasil, cerca de 30% dos médicos sofre burnout.

Há, no Congresso, uma bancada formada por médicos – deputados e senadores –, mas não acredito que estejam interessad­os na amarga sina de seus colegas. O Estado, ao invés de atender às reivindica­ções mínimas da categoria, prefere importar médicos de outros países, e explorá-los de forma desumana. Atualmente, o Brasil é o 3º país do mundo em depressão, com alta taxa de suicídios, inclusive entre osmédicos.

O profission­al afetado pela depressão apresenta uma premente necessidad­e de autoafirma­ção, seguida de negligênci­a crescente com os cuidados pessoais, passa a não desejar mais contato com pessoas, segue-se tristeza, pessimismo, ansiedade, dificuldad­e de atenção, perda do sentimento de realização pessoal, atéumnível de risco suicida. Essa é a realidade do médico brasileiro.

PAULO ANDRÉ CHENSO

é médico em Londrina

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil