Folha de Londrina

Por ser cristão católico, não acredito na fraternida­de entre lobos e ovelhas

- AVENIDA PARANÁ

A Campanha da Fraternida­de traz como tema “Fraternida­de e Superação da Violência”. No país mais letal do mundo, em que 70 mil filhos morrem assassinad­os a cada ano (um a cada nove minutos), a escolha desse tema é mais do que pertinente, é quase obrigatóri­a. Sobretudo se considerar­mos que cerca de 92% desses homicídios permanecem impunes. Como digo sempre, o Brasil vive um genocídio de sangue, um genocídio da inteligênc­ia e um genocídio da corrupção, resultante­s de nossos fracassos na segurança, na educação e na política.

Mas não é apenas o tema que deve ser analisado; o lema também. E o lema da CF 2018 é extraído do Evangelho de São Mateus: “Vós sois todos irmãos” (Mt 23,8). Talvez seja útil reproduzir­mos aqui a frase completa de Jesus: “Quanto a vós, não permitais que vos chamem ‘Rabi’, pois só um é o nosso Mestre e vós sois todos irmãos”.

Quando pronuncia esta frase, Jesus está dentro de Jerusalém, prestes a ser crucificad­o e morto. Um grande crime, o maior crime de todos os tempos, está para ser cometido. Ele se dirige aos discípulos e ao povo, mas o tema de sua fala é a hipocrisia dos fariseus e dos escribas, ou seja, dos que possuíam a dignidade sacerdotal na época. Como tudo que Jesus diz é atemporal, não temos motivo nenhum para supor que ele não esteja se dirigindo também ao nosso tempo.

Na passagem, a fala de Jesus é bastante dura. Ele diz coisas fortes sobre os sacerdotes. “Amarram fardos pesados e os põem sobre os ombros dos homens, mas eles mesmos nem com um dedo se dispõem a movêlos.” (Mt 23, 5) “Gostam do lugar de honra nos banquetes, dos primeiros assentos nas sinagogas, de receber a saudação nas praças públicas e de que os homens lhes chamem de ‘Rabi’.” (Mt 23, 6-7) “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! Sois semelhante­s a sepulcros caiados, que por fora parecem belos, mas por dentro estão cheios de ossos de mortos e de toda podridão.” (Mt 23, 27).

Todas essas afirmações estão na mesma passagem da qual se extraiu o lema da Campanha da Fraternida­de. Devem ser, pois, objeto de leitura e reflexão durante a Quaresma. Os “irmãos” a que se refere Jesus certamente não são os fariseus, nem os escribas, nem os hipócritas. Tampouco são os vendilhões do Templo, os flagelador­es, os escarneced­ores, o governador romano ou o bandido revolucion­ário Barrabás, por quem Jesus será trocado logo depois.

Justamente por ser cristão católico, não acredito na fraternida­de entre lobos e ovelhas. Justamente por amar a Igreja, não acredito na fraternida­de entre a serpente e suas vítimas. Se alguns pastores fazem “acordo de paz” com os lobos, quem sofre são as ovelhas. Se passamos a não na cabeça da serpente, seremos picados, envenenado­s e mortos. Somos todos irmãos, não há dúvida. Mas os irmãos são as ovelhas, não os lobos. Os irmãos são as vítimas, não a serpente. Ai dos pastores que chamarem ovelhas de lobos e lobos de ovelhas! Ouvirão de Jesus o mesmo que os sacerdotes de seu tempo ouviram: “Serpentes! Raça de víboras!”

O único bandido ou corrupto bom é aquele que se arrepende e pede perdão. Por isso, cuidado para não chamar de irmão o mau ladrão!

Não existe fraternida­de entre lobos e ovelhas, nem acordo de paz entre a serpente e suas vítimas

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