A quem interessa um Judiciário fraco e servil?
No meio jurídico é conhecida a frase: “ainda há juízes em Berlim”. Sua origem remete ao conto O Moleiro de Sans-Souci, de François Andrieux, que narra o episódio em que um aldeão se opôs a Frederico II, O Grande, então Rei da Prússia, que pretendia tomarlhe os bens sem respeitar seus direitos.
A frase sintetiza o papel social do Judiciário. O Judiciário é a sede para a sociedade reclamar seus direitos seja diante de quem for. Vale lembrar que não bastam leis. É necessário que as leis sejam cumpridas e nisto reside a atuação do Judiciário. Como disse Rudolf von Ihering (In, A Luta pelo Direito): “a essência do direito consiste na sua efetivação prática”.
Para isto ficar mais claro, basta imaginar o que seria dos consumidores se não houvesse um Judiciário a garantir seus direitos. O mesmo se diga da liberdade de imprensa, tão cara ao Estado Democrático; dos direitos dos trabalhadores; da situação dos empresários diante de tributos inconstitucionais; dos aposentados e seus benefícios previdenciários; das vítimas de violação a direitos da personalidade etc.
Não se está aqui a dizer que o Judiciário brasileiro esteja isento de críticas, tampouco que não comporte aperfeiçoamentos. Pensar assim seria negar a própria condição humana de seus membros. A justiça dos homens não está imune a falhas. Contudo, críticas com matizes ideológicos, movidas por interesses escusos não contribuem para a evolução social. Pelo contrário, têm elevado potencial para enfraquecer uma instituição essencial ao equilíbrio sociojurídico.
Segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em 2016, tramitaram no Judiciário nacional 79,7 milhões de processos. Destes, 29,4 milhões foram instaurados somente em 2016. Assim, a cada grupo de 100.000 habitantes, 12.907 ingressaram em juízo em 2016, o que é sintomático. E mais: apesar do alto volume de processos, conseguiu-se atingir uma produtividade de 100,3%. Portanto – remarquese –, críticas devem existir, mas precisam ser construtivas e em prol da sociedade.
Desses números convém destacar que o Judiciário tem sido chamado com frequência para decidir sobre fornecimento de medicamentos e tratamentos de saúde, a garantir vagas em hospitais e escolas públicas, a analisar atos de improbidade administrativa, a excluir cláusulas contratuais abusivas nas mais variadas espécies de contratos, o que revela que direitos e deveres não estão sendo observados.
Neste contexto, antes de aniquilar o Judiciário em uma sociedade como a nossa é preciso refletir: a quem interessa um Judiciário frágil e subserviente? Por certo àqueles que não pautam suas condutas de acordo com valores éticos e humanitários. Àqueles movidos pela ganância, individualismo, oportunismo e favoritismo. Aos adeptos das negociatas, dos conchavos; aos corruptos, aos criminosos, aos dissimulados; aos falsos e falsários; aos traficantes de drogas, de armas, de influência e de pessoas; aos beneficiários de lucros ilícitos, de contratos fraudulentos, de desvios de verbas, de superfaturamentos, de evasões fiscais, de cobranças e pagamentos “por fora”. Enfim, a todos que temem ser descobertos em suas ações clandestinas para não arcar publicamente com as consequências de uma vida apartada da integridade, da lealdade, da solidariedade e do respeito ao próximo. Afinal, quem não segue por caminhos indignos, quer um Judiciário forte e independente, de maneira a poder fazer valer seus direitos, se necessário; quer um sistema judicial eficiente, eficaz e efetivo.
Não bastam leis. É necessário que as leis sejam cumpridas e nisto reside a atuação do Judiciário”