Tendência é que fluxo aumente
Dados das autoridades brasileiras relatam que, o número de pedidos de refúgios de venezuelanos no Brasil passou de 690, em 2015, para 17 mil, no ano passado
Aprofessora da UEL (Universidade Estadual de Londrina) e coordenadora do Observatório das Migrações de Londrina, Cláudia Siqueira Baltar, ressalta que o êxodo dos venezuelanos para o Brasil ainda é uma questão recente para a academia. “É um fluxo que cresceu muito rápido. Não há perspectiva que o cenário mude nos próximos anos. Na medida em que a situação política na Venezuela vai se agravando, a tendência é que esse fluxo continue nesse ritmo ou aumente”, analisa.
Segundo ela, a questão mais preocupante é a característica social desse fluxo. “Diversas situações vêm sendo identificadas, mas no geral, são pessoas desesperadas com a crise que não é só econômica. Há falta de remédios e até de diálogo com o poder público na Venezuela”, expõe. Dados das autoridades brasileiras relatam que, o número de pedidos de refúgios de venezuelanos no Brasil passou de 690, em 2015, para 17 mil, no ano passado. “Quando a pessoa solicita refúgio, ela ganha o direito de aguardar a resposta no País. O governo tem que garantir direitos, como documentação para que ela possa se estabelecer, estudar, trabalhar”, explica.
A pesquisadora acredita que o Paraná deve ser um dos principais destinos dos venezuelanos. “Depois de São Paulo, os Estados do Sul são os que têm absorvido com mais intensidade os migrantes contemporâneos. O Paraná tem se destacado como uma região de atração expressiva. Mas isso não é novo, vem desde as políticas de colonização de migrantes internacionais no final do século 19 e início do século 20”, aponta. Dados do Ministério da Educação apontaram que o Paraná foi o segundo Estado que mais registrou matrículas de crianças estrangeiras, atrás apenas de São Paulo.
Baltar alerta para a necessidade do País se preparar para receber os novos fluxos migratórios. “Depois dos anos 1930, quando chegaram as últimas levas de migrantes europeus e japoneses, o Brasil se fechou para as migrações. Esse movimento só foi retomado nos anos 1990, mas no sentido contrário. As pessoas deixavam o Brasil. Só agora, principalmente depois de 2010, o Brasil entrou no mapa como destino de refugiados e migrantes, como os haitianos”, detalha. Ela acrescenta, no entanto, que há a exceção dos imigrantes bolivianos, que começaram a entrar no País desde os anos 1950. “Esse grupo, porém, sempre sofreu de uma invisibilidade muito grande.”
Entre a migração de haitianos e venezuelanos, Baltar destaca uma diferença importante. “Os haitianos que chegam aqui conseguiram mobilizar o mínimo de recurso possível pra fazer essa viagem que não é barata. Então há uma seletividade na origem, há uma diferença no perfil social desses indivíduos. No caso dos bolivianos ou venezuelanos, é só questão de ultrapassar fronteira. A migração terrestre é mais fácil. Isso faz com que cheguem pessoas nas mais precárias condições”, aponta. Entre esses grupos, ela ressalta os índios Warao. “É uma situação extrema, eles são mais vulneráveis ainda, porque toda situação de entrada no País, de solicitação de refúgio, passa pela condição de ter documentos, o que eles não têm. Isso acaba sendo um complicador maior.”
Para a pesquisadora, o maior problema é que os imigrantes acabam concorrendo diretamente com os brasileiros no mercado de trabalho. “Não somos como os Estados Unidos, onde existe um mercado de trabalho ‘dual’. Lá existe um mercado de trabalho dos nativos e outro destinado para esse público, de imigração ilegal. Isso foi um choque para os haitianos, que esperavam que houvesse um mercado de trabalho exclusivo para eles”, conta. “Há crise de emprego e eles competem com os brasileiros, o que dificulta o projeto de permanência. Acredito que os venezuelanos vão passar pela mesma situação”, prevê.