CLÁUDIO HUMBERTO
Procuradora da República estuda federalizar investigações, contrariando governo federal; ONU e OAB exigem rigor na apuração do assassinato
A vereadora Marielle Franco tinha coragem de assinar em baixo, dar a cara, bem diferente dos seus assassinos covardes
Rio de Janeiro - Uma multidão acompanhou, na tarde desta quinta (15), o sepultamento da vereadora Marielle Franco (PSOL) no cemitério do Caju, no Rio. A cerimônia ocorreu sob gritos e aplausos de políticos, amigos e familiares. A família não permitiu que a imprensa acompanhasse o enterro, que aconteceu por volta das 18h. No início da cerimônia, um padre fez uma breve fala e disse que há uma ‘matança de pobres’.
O velório de Marielle e do motorista Anderson Gomes ocorreu na Câmara Municipal. Muito aplaudidos, os caixões chegaram ao palácio por volta das 14h30, carregados por colegas e políticos, como Chico Alencar e o deputado estadual Marcelo Freixo. Mulheres formaram um cordão na frente do prédio para recebê-los. A cerimônia foi fechada.
Um ato foi realizado na praça da Cinelândia, em frente à Câmara do Rio. Uma multidão de manifestantes levou flores e cartazes contra a intervenção federal na cidade. Eles também fizeram coro contra a Polícia Militar. A mobilização em torno da morte da vereadora se estendeu a pelo menos 11 capitais, incluindo Curitiba, e também em cidades do interior do País, como Londrina. Em São Paulo, a Avenida Paulista ficou lotada de manifestantes na altura do Masp.
Marielle Franco, 38, foi morta na noite de quarta, junto do motorista Anderson Pedro Gomes, 39, quando voltavam de uma roda de conversa intitulada “Jovens Negras Movendo Estruturas”. O carro em que estavam foi atingido por oito tiros. A polícia trabalha com a hipótese de execução. Uma assessora que estava no banco de trás, Fernanda Chaves, sobreviveu. A vereadora era conhecida por levantar bandeiras sociais e era uma crítica contumaz da atuação da polícia nos subúrbios e favelas do Rio e também vinha se posicionando contrária à intervenção federal.
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, estuda solicitar a federalização da investigação do assassinato. Ela viajou ao Rio nesta quinta-feira para discutir a questão com procuradores e autoridades cariocas. Com a federalização, o inquérito passaria a ser conduzido pela Polícia Federal.
Dodge instaurou procedimento instrutório para avaliar o deslocamento da competência e solicitou à Polícia Federal que adote diligências necessárias.
Para que a investigação seja feita por autoridades federais, a PGR (ProcuradoriaGeral da República) precisa ingressar com um pedido no STJ (Superior Tribunal de Justiça). Mais cedo, o presidente Michel Temer informou que solicitou ao ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, que coloque a Polícia Federal à disposição do interventor Braga Netto para ajudar na investigação.
A Polícia Civil analisa imagens de câmeras de segurança para tentar esclarecer a morte. O chefe da Polícia Civil Rivaldo Barbosa admitiu que o crime pode ter sido uma “execução”. “Toda a investigação está sob sigilo. Estamos diante de um caso extremamente grave que atenta contra a dignidade da pessoa humana, que atenta contra a democracia”, acrescentou.
CONFLITO
Já o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, rebateu a proposta da procuradora-geral da República de federalizar as investigações. “Eu falei com a Raquel Dodge antes de decolar de Fortaleza para cá. Voltei a falar com ela quando cheguei aqui e a convidei para estar conosco. Esse trabalho já está federalizado, porque temos uma intervenção federal acontecendo no Estado. Estamos todos trabalhando juntos. Lembramos que temos confiança no trabalho que está sendo desenvolvido pela Polícia Civil”, disse o ministro.
Os militares entendem que a entrada da Polícia Federal deixaria a Polícia Civil do Rio em descrédito. Apesar de se negar a dar detalhes da investigação, Jungmann disse que os responsáveis pela morte da vereadora serão punidos. O assassinato da vereadora ocorreu dois dias antes de a intervenção federal na segurança pública do estado completar um mês. A imprensa internacional deu grande destaque à morte de Marielli ao longo do dia e diversas entidades, como a Organização das Nações Unidas do Brasil e a Ordem dos Advogados do Brasil, se manifestaram de forma contundente exigindo rigor nas investigações e punição aos responsáveis pelo assassinato da vereadora carioca.