Um Brasil moribundo
Voltando de uma visita ao meus pais, encontro um clamor popular pela intervenção militar! Aqui e acolá já tinha escutado essas bobagens, que denotam a maior e mais perigosa ignorância histórica! Quem não viveu na ditadura militar, pelo menos deveria ter ouvido e lido sobre ela! É esse o mérito do estudo da disciplina de história nas escolas.
Os protestos que deram origem à paralisação do País parecem justos. Parecem! Afinal a classe em questão, que viabiliza o País totalmente rodoviário, é massacrada por altíssimos preços de combustível, por pedágios aviltantes e estradas repletas de armadilhas, para não falar nos fretes e nas cobranças de todo o gênero. Os caminhoneiros são no momento, a grande ponta do icebergue do problema. Mas este, não se restringe a eles nem a nenhuma classe em particular.
Quando leio que “todos#somos#caminhoneiros” acredito que o sejamos mesmo, pois o massacre da carga tributária, da corrupção e do desleixo, deixa poucos brasileiros, privilegiados, de fora. Entretanto, o que parece ser tão óbvio e claro, nem sempre o é. Os protestos que se generalizam país afora, com apoios solidários e bandeiras várias e cada vez mais difusas, estão tornando-se em perigosas e estratégicas alavancas, constrangedoras ao Estado, à Lei e à própria democracia; as estradas paradas são o melhor símbolo do Brasil que não queremos! Que temos um governo apático, fraco e corrupto não é novidade; que a classe política em geral está desmoralizada e é alvo de denúncias, também é claro.
No entanto, a questão que se esconde sob as lonas dos caminhões é a que nos deixa com a pulga atrás da orelha. A quem poderá interessar a sucumbência total de um governo às vésperas da eleição, a escassez de produtos e a ditadura de classes organizadas? De onde vão sair os recursos para satisfazer os reclames (digamos, justos) dos vários grupos? Haverá algum que se diga totalmente satisfeito?
As fake news no WhatsApp se encarregam de dar o tom do que ninguém quer, mas acaba endossando: um Brasil contra si mesmo! Um país que não tem como dar mais nada, a não ser que se reinvente! Todas as crises econômicas e políticas revelam o mesmo: chegamos ao final! No fim do poço de um sistema federativo e tributário arcaico, que exige revisões drásticas, inclusive constitucionais. Os caminhoneiros e todos que com eles se identificam (87%), caminham sem o saber para um buraco negro em que o máximo a conseguir é adiar a agonia de um país.
O pedido de intervenção militar que vem das ruas, além de denotar desconhecimento do que isso representa, é um grito de desespero ao se apelar para uma ordem que não passa de uma quimera! A ordem e o progresso não vêm de mão forte governamental nem de militares na rua. Os salvadores da pátria são sempre uma aberração, que refletem uma sociedade de zumbis em busca de sangue. O País chegou numa encruzilhada em que nenhuma das opções poderá representar uma volta ao passado! Se o desejo é termos um país moderno que reduza fossos e desigualdades, abandonemos por completo um sistema político que os aumenta e reproduz e deixa o povo lutando contra moinhos de vento.
Uma greve como esta com o endosso quase geral, é justa na causa, mas infelizmente inócua e catastrófica para a economia do País e com relevância zero para o processo que o Brasil deve urgentemente iniciar. Temo que as vitórias do momento se reduzam à evidência da facilidade de parar um país moribundo. E se ficar por isto, continuaremos necessitando de muitas greves para lambermos as migalhas e benesses de um Estado que faliu já há alguns anos.
Embora não acredite que as próximas eleições digam muito sobre o que necessitamos para o País, não posso aceitar que o caminho para a reinvenção do Brasil que considero urgente, passe por um generalizado clamor contra a política e o sistema democrático.
A quem poderá interessar a sucumbência total de um governo às vésperas da eleição, a escassez de produtos e a ditadura de classes organizadas?” MANUEL JOAQUIM RODRIGUES DOS SANTOS, padre na Arquidiocese de Londrina