Professoras suspeitas de tortura são presas em Astorga
Três educadoras de creche foram denunciadas porque teriam agredido crianças de dois e três anos
AVara da Infância e Juventude de Astorga (Noroeste) determinou no início da noite de quartafeira (5) a prisão preventiva de três educadoras de uma creche municipal. Elas são suspeitas de terem agredido alunos com idades entre dois e três anos. A denúncia foi feita em 22 de agosto por uma funcionária da creche à Prefeitura Municipal de Astorga, que instaurou procedimento administrativo para apurar os fatos e também encaminhou o caso ao MP (Ministério Público), que ofereceu denúncia. As agressões foram registradas em vídeo pela denunciante, mas as imagens são mantidas sob sigilo pela Justiça.
Segundo o secretário municipal de Administração e Finanças de Astorga, Manoel Joaquim de Oliveira, a testemunha viu apenas uma das três professoras denunciadas praticando as agressões, mas todas foram afastadas por serem responsáveis pela mesma turma e, portanto, consideradas coniventes. “Temos 47 salas de aula de creche no município. Nessa creche específica tem quatro salas e, normalmente, ficam três a quatro educadoras por sala, incluindo o estagiário”, explicou.
Das três professoras, duas têm cerca de 20 anos na atividade e a outra foi contratada há um ano e está em estágio probatório. Contra nenhuma delas havia qualquer denúncia semelhante anteriormente, segundo Oliveira. “A princípio, achamos que as agressões são recentes. Não tínhamos nenhuma denúncia ou notificação sobre maus tratos até o dia 22 de agosto. Acreditamos que seja um caso pontual. A pessoa que denunciou viu as agressões acontecerem algumas vezes e resolveu filmar”, disse.
As três professoras foram afastadas preventivamente por 60 dias, prazo de duração do procedimento administrativo aberto pela prefeitura, e tiveram os salários suspensos, conforme determina o Código do Servidor. O secretário disse que os responsáveis pelo procedimento estão providenciando as notificações para ouvir as servidoras. A diretora da creche também deverá ser chamada para depor. Oliveira ressaltou que o Plano de Cargos e Salários da Educação prevê um mínimo de 40 horas de treinamento por ano. “Neste ano, a gente já fez 148 horas e um dos treinamentos tratava do assunto de maus tratos e violência nas escolas. As professoras estavam cientes; não teriam motivo para fazer isso.”
Na Justiça, as professoras irão responder a processo por tortura. O pedido de prisão preventiva foi feito por medida de segurança porque o caso gerou uma comoção na cidade. Elas estão detidas na Delegacia de Astorga.
HEMATOMAS
O promotor de Justiça Lucílio de Held Júnior ressaltou não ter dúvidas quanto a autoria das educadoras no crime de tortura. “Recebemos vídeos de uma testemunha que estava na sala, de uma situação de tratamento cruel de uso de violência física contra crianças. Instauramos o procedimento criminal e ouvimos a diretora da creche, as professoras envolvidas, os pais e todos os relatos confirmavam o depoimento da denunciante”, afirmou. “Os relatos encaixaram com a denúncia e chegamos à conclusão de que o uso da violência física e psicológica acontecia diariamente e de forma sistemática. Dessa violência resultou em alteração na esfera comportamental.”
Ele apontou que as educadoras foram enquadradas no artigo 1º, inciso 2º, paragrafo 4º da lei 9455/97. “Esse crime prevê uma pena de dois a oito anos de prisão para tortura de forma ativa e de um a quatro anos a quem se omite de coibir a situação”, destacou.
A advogada das professoras não foi localizada pela reportagem.
Afilha de um auxiliar de linha de produção de Astorga (Noroeste) é aluna da creche municipal onde três educadoras foram presas suspeitas de agressões contra as crianças. A menina estuda na creche desde o início de 2018, mas foi depois do retorno das férias de julho que ele e a mãe da menina começaram a observar marcas no corpo e mudança de comportamento. Além de hematomas nas pernas e nádegas, a garota, de um ano e oito meses, passou a ter problemas para dormir, deixou de se alimentar com a mesma vontade de antes, começou a apresentar vômitos frequentes e relutava na hora de ir para o banho.
“Em 7 de agosto, a mãe da minha filha me mandou uma mensagem dizendo que ela tinha quatro marcas no corpo e me perguntou se ela havia caído. Eu disse que não tinha visto, mas uma criança pequena, vira e mexe, esbarra e cai. Não ligamos uma coisa com a outra”, contou o pai. “Durante a noite, ela passou a acordar assustada, duas ou três vezes, chorando, gritando e chamando por mim e pela mãe. Ela também não queria mais tomar banho e começou a comer pouco sendo que ela sempre se alimentou muito bem. Mas a gente achava que as mudanças eram porque ela estava crescendo.”
A mudança de comportamento da menina só começou a fazer sentido no final de agosto, quando veio à tona a denúncia das agressões que teriam sido cometidas pela professora da creche. A funcionária que testemunhou as agressões e informou a prefeitura fez quatro vídeos. A filha dele aparece em dois deles. “Em um, ela só está do lado da criança que está sendo agredida. No outro, ela aparece sendo agredida. Ela está dormindo quietinha no colchonete
“Uma criança que não consegue nem falar uma frase completa, quem dirá se defender”
e a professora chega, puxa o colchonete e minha filha acorda assustada. Não dá para entender o motivo das agressões, que nas imagens acontecem sempre no horário do sono. Não dá para ouvir a voz de nenhuma criança nos vídeos”, relata o pai.
Quando soube do fato, o pai diz que a primeira atitude foi chorar de tristeza junto com a filha. Mas após assistir aos vídeos, no Ministério Público, a tristeza deu lugar ao ódio. “Uma criança que não consegue nem falar uma frase completa, quem
dirá se defender. Veja o que as supostas professoras são capazes de fazer.” Com o afastamento das professoras, o pai disse que a menina já começa a retomar o comportamento anterior. A qualidade do sono está melhorando, os vômitos cessaram
e ela já aceita tomar banho tranquilamente.
O caso mobilizou a pequena cidade de cerca de 26 mil habitantes. Nesta quinta-feira (6), às 13 horas, a população fez um protesto em frente à Prefeitura Municipal pedindo justiça.