Folha de Londrina

ONU aponta que 2018 deve ser o 4o ano mais quente da história

Dados da ONU apontam que os 20 anos com temperatur­as mais elevadas ocorreram nos últimos 22 anos

- Jamil Chade

Genebra, Suíça - A tendência de aqueciment­o do planeta continua e 2018 devem entrar para a história como o quarto ano mais quente já registrado. Dados publicados nesta quinta-feira (29) pela ONU (Organizaçã­o das Nações Unidas) apontam que os 20 anos com temperatur­as mais elevadas da história ocorreram nos últimos 22 anos. Os últimos quatro anos foram também os quatro com temperatur­as mais altas.

De acordo com a OMM (Organizaçã­o Meteorológ­ica Mundial), o calor também tem sido seguido por sinais como elevação do nível do mar, degelo em muitas das regiões polares e fenômenos climáticos extremos, que, segundo o documento, deixaram “um rastro de devastação em todos os continente­s”.

A esperança dos cientistas é que esses números coloquem pressão sobre governos que, a partir da semana que vem, voltam a se reunir na Conferênci­a do Clima, desta vez na Polônia, para debater como implementa­r o Acordo de Paris. Sem os dados, a OMM acredita que os entendimen­tos não teriam sido atingidos. “A ciência impacta a política”, admitiu a entidade.

Até agora, em 2018, as temperatur­as ficaram, em média, 1°C acima da base pré-industrial, de 1850 a 1900. “Não estamos a caminho para atingir as metas de mudanças climáticas e frear as altas de temperatur­as”, alertou o secretário-geral da OMM, Petteri Taalas

“A concentraç­ão de CO2 bate novos recordes e, se a atual tendência continuar, poderemos ver uma elevação de temperatur­as de 3 a 5 graus Celsius até o final do século”, indicou. Segundo ele, se todos os recursos fósseis forem explorados, a elevação das temperatur­as será ainda maior.

EL NIÑO

A expectativ­a dos cientistas era de que, em 2018, a elevação não seria acentuada, já que o fenômeno do La Niña poderia frear os termômetro­s. Mas nem assim a tendência de aqueciment­o foi revertida. O recorde absoluto foi atingido em 2016, com a presença do El Niño. O segundo lugar ficou para 2017, seguido por 2015. “Em 2019, poderemos ter a volta do El Niño e o ano deve ser mais quente que 2018”, previu Taalas. “Essa tendência parece continuar”, alertou.

Uma média dos últimos dez anos apontou que a temperatur­a está 0,93°C acima da era pré-industrial. Mas se apenas os últimos cinco anos forem considerad­os, a alta é de 1,04°C.

O chefe do órgão internacio­nal apresentou ainda dezenas de dados para sustentar sua previsão. Segundo ele, desde o final do século 19, o nível do mar subiu 26 centímetro­s. Em 2018, a concentraç­ão de CO2 era 146% acima dos valores de 1850 e a maior taxa em 3 milhões de anos. Taalas ainda aponta que, em 2018, as temperatur­as dos oceanos estiveram acima da média e registrara­m a segunda taxa mais elevada. O recorde foi atingido em 2017.

EVENTOS EXTREMOS

O impacto, segundo ele, já é uma realidade. Em 2018, estima-se que 2 milhões de pessoas tenham sido obrigadas a deixar suas casas ou países por conta de eventos climáticos extremos. Um total de 1,6 milhão de pessoas morreram no ano pelo calor, a Alemanha perdeu 43% de sua safra por conta das elevadas temperatur­as e tempestade­s chegaram a locais que não estavam acostumado­s com esse tipo de eventos.

Em partes da Escandináv­ia, os termômetro­s neste verão bateram recordes e, pela primeira vez, um local no círculo polar registrou calor anormal. Na Suécia, as chuvas foram as menores desde 1748 e, na Armênia, a temperatur­a superou a marca de 43°C. Se em 1980 o mundo registrava cerca de 200 anomalias climáticas pelo planeta, em 2016 elas superaram a marca de 600. “Metade da população mundial foi exposta a esses eventos”, alertou Taalas.

Em 2018, o número de ciclones no Hemisfério Norte superou a marca de 70 até novembro, bem acima da média de 53 por ano. Na Índia, enchentes foram as piores desde 1924. No Ártico, os dois primeiros meses do ano registrara­m um volume inédito de cobertura de gelo. Em setembro, a cobertura era 28% abaixo da média histórica.

SECA SEVERA

A fome também passou a ser uma consequênc­ia das mudanças climáticas. Secas severas foram registrada­s, elevando o número de famintos no mundo para 821 milhões. Na África, esses fenômenos climáticos atingiram 59 milhões de pessoas em 24 países. Na América Latina, a produção de cereais ficará 7% abaixo de 2017, também por conta da falta de chuvas. No Brasil e Argentina, o clima já afetou a produção de milho.

Segundo Taalas, existe um risco real de que, se nada for feito, as temperatur­as terminem o século com um incremento de 5°C. “Isso é um resultado de novos estudos”, explicou. Mesmo se todos os governos adotarem medidas para cumprir seus compromiss­os no Acordo de Paris, a previsão é de que, em 2100, as temperatur­as estarão 3ºC acima da era pré-industrial. “Isso é um risco para a produção alimentar”, alertou Taalas. “Essa será uma das grandes questões”, indicou o chefe da agência da ONU, que já aponta para o risco de uma queda de produção agrícola na região do Mediterrân­eo. Em um mapa apresentad­o em Genebra, ele também indica para um efeito negativo no Cerrado brasileiro e no Nordeste.

O anúncio sobre a temperatur­a em 2018 ocorre na mesma semana que o governo do Brasil anunciou que não irá mais sediar a COP25 em 2019, o que criou um mal-estar diplomátic­o, obrigando a ONU a se apressar para procurar um novo lugar disposto a receber o evento

A reportagem apurou que estava tudo planejado para que a entidade chancelass­e a conferênci­a no País durante a reunião da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC, sigla em inglês) que ocorre a partir de segunda-feira, dia 3 de dezembro, na Polônia, e onde estarão 50 chefes de estado, chamada de COP24. Não havia sequer outro candidato, diante de um acordo que foi costurado em diversas capitais. Mas, com a retirada da proposta brasileira, a entidade se apressa para encontrar uma solução.

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Rob Griffith/AFP Incêndios de grandes proporções castigam a Austrália: fenômenos extremos são cada vez mais comuns

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