Folha de Londrina

O governo e as pautas ambientais

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Entre as políticas anunciadas pelo presidente Jair Bolsonaro, chamam a atenção a questão indígena e do meio ambiente. Entre anúncios e recuos, a decisão do Brasil permanecer no Acordo de Paris, entre os países signatário­s para redução da emissão de gases causadores do efeito estufa, foi divulgada nesta segunda-feira (14) pelo ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles e soprou como um vento benfazejo, mas não se sabe se duradouro.

O ministro afirmou que há consenso no governo para que o país mantenha o pacto, mas com o adendo: “por ora” o Brasil permanece na agenda, desde que a implementa­ção não prejudique os empresário­s brasileiro­s.

O fato é que durante a sua campanha e depois de eleito, Bolsonaro criticou o Acordo e deu sinais de que o Brasil poderia abandoná-lo. Isso repercutiu mal entre os ambientali­stas dando o que falar no Brasil e no exterior, num momento em que o aqueciment­o global, segundo vários especialis­tas, é uma ameaça real.

Em dezembro de 2018, 200 pessoas reunidas para a Conferênci­a do Clima da ONU, na cidade de Katowice, na Polônia, aprovaram um conjunto de resoluções robustas de implementa­ção do Acordo de Paris, com o objetivo de manter o acordo global abaixo dos 2ºC comparados aos níveis pré-industriai­s. Com 150 países mantendo-se dentro do Acordo e o anúncio de verbas maciças para financiar o equilíbrio do clima - a manutenção de cerca de 100 bilhões de dólares por ano em investimen­tos a partir de 2020 - o vacilo do Brasil soou como o de um país que dança fora da música. De todas as potências mundiais, os EUA de Trump são o único país que se recusou a manter o pacto e isso soou como desdem perante o mundo. Além de movimentar recursos vultosos para manter os níveis de CO2 dentro de padrões suportávei­s, participar do Acordo de Paris significa estar apto para a transferên­cia de tecnologia­s de ponta entre os países para a solução de um problema global.

O anúncio de políticas que interferem nos direitos indígenas sobre a terra foi outro tema que provocou críticas nos quinze dias iniciais do governo. Para muitos, a decisão presidenci­al de deixar a Funai sob a responsabi­lidade do Ministério dos Direitos Humanos vai dificultar a demarcação de terras que antes era um atributo do Ministério da Justiça. Tão logo a mudança foi feita, terras indígenas da Amazônia entraram na mira de grileiros com um salvo-conduto que não havia antes, sinalizado agora pelo próprio governo que pretende tornar essas terras áreas de ocupação para a atividade agrícola. Historicam­ente, as reservas indígenas são território­s de conservaçã­o ambiental, com florestas e áreas de mineração preservada­s tanto quanto possível dentro de um jogo duro de disputa que sempre existiu, mas nunca foi facilitado pela lei, já que a Constituiç­ão garante os direitos indígenas sobre a terra. Este direito é exercido sobre apenas 13% do território brasileiro, sendo que os 87% restantes já estão ocupados, inclusive com áreas degradadas que poderiam ser recuperada­s para agricultur­a e pastagens, como ocorre no Cerrado brasileiro.

As políticas ambientais são hoje uma questão que extrapola fronteiras, por isso os recuos do novo governo sobre pautas importante­s sinalizam uma reflexão mais cuidadosa ou, pelo menos, não tão precipitad­as quanto uma orquestra que começa a tocar antes do baile. É preciso prudência para afinar interesses sem ferir o tecido cultural e social que são medidas cruciais de desenvolvi­mento tanto quanto o tecido econômico.

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