Mãe, quer ir ao cinema?
Recebo a mensagem de um amigo e leitor, Rodrigo de Andrade Lopes, dedicada à sua mãe, Maria Cristina de Andrade Lopes, que nos deixou em setembro de 2018. Devo dizer que me comovi profundamente com as palavras do Rodrigo, até porque me lembrei de Aracy, que partiu em 2011, vítima da mesma doença. Peço aos meus sete leitores que leiam - e às nossas mães, onde estiverem, que nos abençoem:
“Hoje eu assisti ao episódio de uma série de TV que adoro, The 70’s Show, e me lembrei de minha mãe.
No episódio, a Sra. Forman, mãe do personagem Eric, o convida para fazer compras e ir ao cinema. Eric, todo envergonhado, não entende a motivação do convite, nem vê a situação como uma oportunidade singular em sua vida. Para ele, é como se o convite da mãe fosse um castigo. A situação de Eric me pareceu hilária, divertida, devido ao quase tragicômico constrangimento dele. Eu me enxerguei como o próprio Eric: um jovem adolescente em mesma situação. Sempre me senti constrangido e incomodado em acompanhar minha mãe em compromissos, em oportunidades de convivência e de companheirismo em nossa vida em família e amigos. Sim, este era eu mesmo.
Mas qual a minha surpresa quando tudo ficou claro para mim, pois o convívio de Eric e da Sra. Forman começara, pouco a pouco, a funcionar como engrenagens que se encontram tendo entre si um pouco de azeitado carinho e respeito, mas sem deixar de lado uma pitadinha de incômodo, de falta de jeito e de traquejo entre eles. Com certeza um encontro inicialmente desconcertante, misterioso e sem um propósito claro para Eric; porém, um momento de convivência afetuosa entre mãe e filho, que sem dúvida marcaria a vida dos Forman positivamente.
Para mim, assistir àquele episódio foi como olhar para um espelho, incomodando-me com aquela imagem triste, retorcida e sofrida que eu fazia da minha relação com minha mãe e que eu não poderia jamais voltar no tempo para resolver.
Ao final do episódio, eu me perguntei: ‘Quantas vezes eu convidei minha mãe para sairmos juntos? Para fazermos compras, ou para tomarmos um café, ou para irmos ao cinema?’ - ‘Quantas oportunidades eu perdi de conviver despretensiosamente com minha mãe?’ E a resposta veio a minha cabeça, perturbadoramente: ‘Eu nunca o fiz enquanto eu a tinha ao meu lado. Que arrependimento sinto hoje!’
Parafraseando os poetas populares, eu deveria ter saído mais, ter vivido mais, ter amado mais minha mãe que tanto esteve ao meu lado em seu silêncio amoroso, contido e respeitoso à minha individualidade. Desculpe, mamãe querida, por ter falhado. Mas agora já foi...
É assim que a vida nos trata, com merecidos sacolejos e lições aprendidas. Embora às vezes tardiamente. O que me conforta, de certa maneira, é o alívio que tenho ao lembrar quando o Paulo Briguet, em sua mensagem de condolências, me escreveu: ‘Fique sereno, pois a dor com o tempo se transformará em saudade’.
Então eu digo, alto e claro a todos: não cometam o mesmo erro! Enquanto a sua mãe ao seu lado estiver, ame-a, faça-lhe companhia, ria, chore, adore, pule de alegria, pois é só o que importa ao final de tudo... É só o que nos resta a fazer!”
Quantas vezes eu convidei minha mãe para sairmos juntos? Quantas oportunidades eu perdi de conviver despretensiosamente com minha mãe?’