Contrato de aprendizagem em época de pandemia
A Covid-19 tem causado grande impacto na economia global. As discussões são inúmeras e em vários segmentos. Com a propagação do vírus, muitas empresas têm enfrentado desafios com relação aos seus colaboradores, principalmente quanto aos aprendizes, para entender quais os limites de sua atuação, para se evitar riscos trabalhistas futuros.
Inicialmente, cabe esclarecermos que o artigo 429 da CLT prevê que as empresas de qualquer natureza, salvo exceções, são obrigadas a empregar e matricular nos cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem número de aprendizes equivalentes a 5%, no mínimo, e 15%, no máximo, dos trabalhadores existentes em cada estabelecimento, cujas funções demandem formação profissional.
O contrato de aprendizagem é ajustado por escrito e por prazo determinado, não superior a 02 anos, em que o empregador se compromete a assegurar ao maior de 14 e menor de 24 anos, inscrito em programa de aprendizagem, formação técnico-profissional, compatível com o seu desenvolvimento físico, moral e psicológico, e o aprendiz, a executar, com zelo e diligência, as tarefas necessárias a essa formação.
O Governo Federal editou as Medidas Provisórias n.º 927 e 936, esta convertida na Lei 14.020/20, para o enfrentamento da crise e, também, para instituir o programa emergencial de manutenção do empregado e da renda. Desde logo, destaco que as novas regras não se aplicam integralmente aos contratos de aprendizagem.
De acordo com o artigo 5º, da MP 927, em relação aos aprendizes, só há autorização para a adoção do regime de home office sendo vedada, portanto, a utilização dos outros mecanismos disponíveis, tais como o direcionamento do trabalhador para qualificação, banco de horas, etc.
Já a Lei 14.020/20 trouxe a possibilidade de suspensão do contrato de trabalho e, de redução proporcional de jornada e de salários, não existindo nenhuma vedação em relação aos aprendizes.
Ocorre que, diante da especificidade do contrato aprendizagem, cumulado ao fato de que os aprendizes deslocam-se ordinariamente para os locais de trabalho através de transporte público coletivo, onde há alto risco de contaminação, o MPT editou a Nota Técnica 05/20 dispondo que a atual pandemia caracteriza a interrupção dos contratos de trabalho dos aprendizes, sem implicar em redução ou o não pagamento da remuneração, ante o princípio da proteção integral.
Ainda, o Ministério Público do Trabalho também vem recomendando às empresas que se abstenham de proceder à rescisão dos contratos de aprendizagem, fora das hipóteses do artigo 433 da CLT e do artigo 13 da IN SIT 146/2018.
Como se verifica, existe evidente conflito entre a Lei 14.020/20 e a Nota Técnica 05/2020. É óbvio que, não obstante, a representatividade que tem o Ministério Público do Trabalho, uma Nota Técnica não pode se sobrepor a uma Lei Federal.
Ocorre que, a Constituição Federal confere ao Ministério Público a atribuição de zelar pelo efetivo respeito aos direitos e garantias legais assegurados a todas as crianças e adolescentes, promovendo medidas extrajudiciais e judiciais cabíveis.
Diante disso e considerando a situação de vulnerabilidade social em que geralmente se encontram os aprendizes e os efeitos que a suspensão, a redução da remuneração e a rescisão irregular do contrato de aprendizagem podem trazer, há risco de os empregadores, se não seguirem as orientações da citada Nota Técnica, serem autuados pelo referido órgão.
Logo, as medidas mais seguras nesse momento de pandemia que podem ser adotadas pelos empregadores em relação aos aprendizes são as de abster de proceder à rescisão dos contratos de aprendizagem, adotar o regime de home office, conceder férias ou, interromper as atividades práticas e teóricas da aprendizagem profissional, mas sem prejuízo da remuneração integral.