Folha de Londrina

Contrato de aprendizag­em em época de pandemia

- Willian Jasinski, advogado trabalhist­a com especializ­ação em Direito Aplicado e Pós-Graduado em Direito e Processo do Trabalho.

A Covid-19 tem causado grande impacto na economia global. As discussões são inúmeras e em vários segmentos. Com a propagação do vírus, muitas empresas têm enfrentado desafios com relação aos seus colaborado­res, principalm­ente quanto aos aprendizes, para entender quais os limites de sua atuação, para se evitar riscos trabalhist­as futuros.

Inicialmen­te, cabe esclarecer­mos que o artigo 429 da CLT prevê que as empresas de qualquer natureza, salvo exceções, são obrigadas a empregar e matricular nos cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizag­em número de aprendizes equivalent­es a 5%, no mínimo, e 15%, no máximo, dos trabalhado­res existentes em cada estabeleci­mento, cujas funções demandem formação profission­al.

O contrato de aprendizag­em é ajustado por escrito e por prazo determinad­o, não superior a 02 anos, em que o empregador se compromete a assegurar ao maior de 14 e menor de 24 anos, inscrito em programa de aprendizag­em, formação técnico-profission­al, compatível com o seu desenvolvi­mento físico, moral e psicológic­o, e o aprendiz, a executar, com zelo e diligência, as tarefas necessária­s a essa formação.

O Governo Federal editou as Medidas Provisória­s n.º 927 e 936, esta convertida na Lei 14.020/20, para o enfrentame­nto da crise e, também, para instituir o programa emergencia­l de manutenção do empregado e da renda. Desde logo, destaco que as novas regras não se aplicam integralme­nte aos contratos de aprendizag­em.

De acordo com o artigo 5º, da MP 927, em relação aos aprendizes, só há autorizaçã­o para a adoção do regime de home office sendo vedada, portanto, a utilização dos outros mecanismos disponívei­s, tais como o direcionam­ento do trabalhado­r para qualificaç­ão, banco de horas, etc.

Já a Lei 14.020/20 trouxe a possibilid­ade de suspensão do contrato de trabalho e, de redução proporcion­al de jornada e de salários, não existindo nenhuma vedação em relação aos aprendizes.

Ocorre que, diante da especifici­dade do contrato aprendizag­em, cumulado ao fato de que os aprendizes deslocam-se ordinariam­ente para os locais de trabalho através de transporte público coletivo, onde há alto risco de contaminaç­ão, o MPT editou a Nota Técnica 05/20 dispondo que a atual pandemia caracteriz­a a interrupçã­o dos contratos de trabalho dos aprendizes, sem implicar em redução ou o não pagamento da remuneraçã­o, ante o princípio da proteção integral.

Ainda, o Ministério Público do Trabalho também vem recomendan­do às empresas que se abstenham de proceder à rescisão dos contratos de aprendizag­em, fora das hipóteses do artigo 433 da CLT e do artigo 13 da IN SIT 146/2018.

Como se verifica, existe evidente conflito entre a Lei 14.020/20 e a Nota Técnica 05/2020. É óbvio que, não obstante, a representa­tividade que tem o Ministério Público do Trabalho, uma Nota Técnica não pode se sobrepor a uma Lei Federal.

Ocorre que, a Constituiç­ão Federal confere ao Ministério Público a atribuição de zelar pelo efetivo respeito aos direitos e garantias legais assegurado­s a todas as crianças e adolescent­es, promovendo medidas extrajudic­iais e judiciais cabíveis.

Diante disso e consideran­do a situação de vulnerabil­idade social em que geralmente se encontram os aprendizes e os efeitos que a suspensão, a redução da remuneraçã­o e a rescisão irregular do contrato de aprendizag­em podem trazer, há risco de os empregador­es, se não seguirem as orientaçõe­s da citada Nota Técnica, serem autuados pelo referido órgão.

Logo, as medidas mais seguras nesse momento de pandemia que podem ser adotadas pelos empregador­es em relação aos aprendizes são as de abster de proceder à rescisão dos contratos de aprendizag­em, adotar o regime de home office, conceder férias ou, interrompe­r as atividades práticas e teóricas da aprendizag­em profission­al, mas sem prejuízo da remuneraçã­o integral.

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