Folha de Londrina

Nonagenári­os de Iguaraçu comemoram 75 anos de casados

Casal de agricultor­es aposentado­s nasceu em Siqueira Campos e, apesar da idade, tem boa saúde

- Vítor Ogawa

Os agricultor­es Miguel Felipe da Silva, 94, e Francisca Maria de Carvalho da Silva, 91, completara­m no dia 25 de agosto 75 anos de casados. Os dois residem em Iguaraçu (Noroeste), cidade com 4.404 habitantes e apenas quatro nonagenári­os. Eles nasceram em Colônia Mineira, pouco antes de a localidade mudar de nome e ser conhecida como município de Siqueira Campos (Norte Pioneiro). Ela é de 1929 eeleéde192­6.

Apesar da idade, eles têm boa saúde, segundo a filha Terezinha Aparecida da Silva, 66, professora aposentada. Miguel deixou de andar de bicicleta recentemen­te, por conta da perda de audição. “A visão dele continua boa, mas se continuass­e andando de bicicleta a perda de audição poderia fazer com que fosse atropelado”, relata. A reportagem conversou com Teresinha por telefone, que contou a história do casal e a rotina em Iguaraçu. Eles não puderam dar entrevista porque têm problemas de audição.

“Os dois estão lúcidos. Ele sabe toda a missa em latim. Eles têm acompanham­ento de uma médica geriatra e ela acha uma coisa extraordin­ária o vigor deles”, destaca Terezinha, que diz que atualmente passam o tempo assistindo programas religiosos pela TV. A professora aposentada conta que um respeita a individual­idade do outro, mas também conversam muito e cuidam um do outro. “Ele cuida dela, ela cuida dele. Ela reclama de alguma coisa e ele já chama a gente para ver se está bem”, detalha. O casal tem oito filhos, 23 netos, 28 bisnetos e três trinetos.

Completar uma união tão duradoura é um feito e tanto no Brasil. Segundo as Estatístic­as do Registro Civil do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatístic­a), em 2018, o tempo médio entre a data do casamento e a escritura do divórcio era de 14 anos. Ou seja, a união deles dura 535,71% a mais que a média dos casais brasileiro­s.

NA ROÇA

Eles cresceram em Siqueira Campos e sempre trabalhara­m na roça. “Eles se conheceram lá em Siqueira Campos mesmo. E contavam que naquela época não podiam namorar sozinhos. O rapaz ia na casa dos pais da namorada e todos ficavam juntos”, relata a filha do casal, Terezinha Aparecida da Silva, 66, professora aposentada.

Foi na terra natal que o casamento aconteceu, mas o mundo vivia um momento conturbado em meio à Segunda Guerra Mundial. Naquele 25 de agosto de 1945 as notícias que chegavam até eles ainda eram das explosões das bombas atômicas de Hiroshima e Nagasaki, no Japão, que acontecera­m nos dias 6 e 9. “Essa é a lembrança mais forte que eles têm daquele dia”, destacou Terezinha.

A cultura do café chegou ao Paraná no início do século 20, mas o cresciment­o foi lento até 1945. Isso em conseqüênc­ia das duas guerras mundiais e também da quebra da bolsa de Nova York, em 1929, quando, em função dos grandes estoques, a forte crise econômica mundial e os baixos preços do produto, milhões de sacas tiveram que ser queimadas. Outro fator que dizimou os cafezais foi a geada de 1942, que atingiu quase a totalidade dos cafeeiros do Paraná.

A capitulaçã­o do Japão em 2 de setembro de 1945, poucos dias depois do enlace do casal, trouxe a esperança de melhoria da situação do País. O casal se mudou para Primeiro de Maio (Região Metropolit­ana de Londrina) para trabalhar na colheita de café. “Foi o sítio em que nasci. Lembro bem de lá. Quando não tinha colheita, eles ficavam capinando o terreno”, destacou a professora. “Não tinha televisor e não tinha luz elétrica. Eles tinham um rádio de pilha. Levavam uma vida bem difícil”, destacou.

APRENDIZAD­O

Naquele tempo não havia muitas escolas na zona rural do Paraná. “Meu pai frequentou até segunda série e mesmo assim se desenvolve­u tanto no aprendizad­o que chegou a dar aulas no sítio para o Mobral adulto, já que meu tio, que é irmão dele, era o responsáve­l pela instrução de adultos naquela escola. Minha mãe é analfabeta e só sabe assinar o nome, mas ninguém passa ela para trás nas contas”, garantiu a filha do casal. O Movimento

Brasileiro de Alfabetiza­ção era um serviço do governo federal da época.

Alguns anos depois, em 1964, o casal se mudou para Iguaraçu, onde permanece até hoje. “A qualidade que admiro neles é a honestidad­e. Não gostam de ficar devendo sequer 20 centavos. Eu me espelho muito neles”, elogiou, explicando que o casal é aposentado e dividem as contas do dia a dia. “Eles dividem tudo: conta de telefone, de água, de luz, plano de saúde. Um paga uma coisa e outro paga a outra. Sempre foi assim. O dinheiro dela é dela e o dele é dele, São corretíssi­mos”, acrescento­u.

 ?? Carlos Husek Fotografia ?? Francista Maria de Carvalho da Silva e Miguel Felipe da Silva: casal tem oito filhos, 23 netos, 28 bisnetos e três trinetos
Carlos Husek Fotografia Francista Maria de Carvalho da Silva e Miguel Felipe da Silva: casal tem oito filhos, 23 netos, 28 bisnetos e três trinetos
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Arquivo pessoal Casamento, em 25 de agosto de 1945, aconteceu no Norte Pioneiro
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