Folha de Londrina

Profission­ais da saúde relatam caos na capital do Amazonas

- Vitor Ogawa

Manaus vive um cenário caótico, com hospitais lotados, falta de oxigênio, falta de medicament­os, equipament­os de proteção escassos, muitas mortes e pacientes de todas as idades sendo contaminad­os pela Covid-19. A bióloga do Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), Erika Schloemp, mora em Manaus e relatou que os hospitais da cidade estão completame­nte colapsados.

“A gente reconhece que a maior parte da população não se cuidou. O que se viu foram muitas festas ilegais com 200 a 300 pessoas. As pessoas estão sem máscaras nas ruas”, apontou. Ela relatou que no começo de janeiro o governo tentou implantar o lockdown, mas os comerciant­es começaram um quebra- quebra para não fechar o comércio e conseguira­m. “E os hospitais, que sempre foram precários, não deram conta de atender todos os contaminad­os nessa pandemia.”, destacou.

Médica do Samu de Manaus, Alessandra Said relatou que só tem visto morte e que a situação está muito pior que na primeira onda. “Essa variante sofreu mutação e agora atinge crianças, bebês. A gente atende pacientes que não eram da nossa faixa etária. Antes eram só idosos ou pacientes com comorbidad­es. Agora são jovens com 30, 40 e 50 anos e sem comorbidad­es”, destacou. Ela acrescento­u que os pacientes têm feito todo o ciclo de tratamento que era realizado na primeira onda da doença em Manaus, mas que agora não tem surtido efeito.

“Na primeira onda, chegavam com cinco ou seis dias depois de terem se contaminad­o e estavam ruins e quando chegavam no 12º dia já estava bem. Agora, ao chegar no 14º dia, a dispneia está intensa e o paciente não saiu da parte inflamatór­ia e permanece com sintomas exacerbado­s. Essa cepa é mais virulenta, mais perigosa e mais danosa”, destacou.

Said disse que a gravidade da doença, pelo que tem observado entre os pacientes que acolhe, é muito ligada a pacientes com obesidade.

Ela tem testemunha­do que os corredores dos hospitais estão repletos de pacientes, muitas vezes em cadeiras de plástico e distantes dos locais em que há oxigênio encanado.

“Os pacientes Covid precisam ficar internados em uma ala que a gente chama de rosa, para ficarem isolados de outros pacientes, mas não tem mais como expandir, então a gente tem deixado os pacientes na própria maca do Samu e com a bala (cilindro) de oxigênio da ambulância. É triste saber que aquele oxigênio vai acabar. A gente deixa o paciente à noite e de manhã passa lá para pegar a maca, porque o paciente foi a óbito e é só com a morte do paciente que a gente consegue recuperar a maca”, declarou.

Sobre o oxigênio que o governo federal enviou, a médica confirmou a chegada de “algumas toneladas de oxigênio, mas quenão supriram toda a necessidad­e. “O consumo é muito rápido. Um paciente consome 15 litros de oxigênio por minuto e um cilindro daquele maior dura três horas. Imagine o consumo em 24 horas?”, apontou.

Ela alertou que muitas pessoas, por desinforma­ção, não afirmam que o paciente está com sintomas gripais ou de Covid quando chamam o Samu, por acharem que o Samu não atenderia um chamado desse tipo. “A gente não usa a proteção para a Covid o tempo todo para economizar material. Quando ligam e dizem que a pessoa caiu no chão, a gente vai sem o macacão. Mas quando no local a gente vê que a pessoa está com sintomas de Covid, é preciso voltar para a ambulância para se paramentar, mas nesse intervalo a gente já foi exposta”, relatou a médica, que já pegou Covid na primeira onda da doença.

“A gente também tem família e não quer levar a doença maldita para dentro de casa. Eu sou separada e deixei a minha filha por 70 dias na casa do pai dela para que eu não levasse a doença para ela. Passei meu aniversári­o e o Dia das Mães sem a minha filha”, lamentou.

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Sandro Pereira/folhapress Parentes de pacientes internados com Covid-19 fazem fila para recarregar cilindros de oxigênio em empresa em Manaus

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