Folha de Londrina

Erros diagnóstic­os: uma epidemia silenciosa

- Leandro Arthur Diehl é professor da Universida­de Estadual de Londrina (UEL) e administra­dor do site Raciocínio Clínico

Médicos erram. Nenhuma surpresa, afinal médicos são seres humanos, e por definição, estão sujeitos a erros. Por mais simples e óbvia que seja esta afirmação, nem todos se dão conta desta verdade: erros diagnóstic­os são um importante problema de saúde pública.

Estudos realizados nas últimas décadas mostram que cerca de 15% dos diagnóstic­os feitos são diagnóstic­os errados. Nos casos mais severos, o resultado pode ser a morte. Estima-se que 40 mil a 80 mil mortes por ano nos Estados Unidos sejam decorrente­s de erros diagnóstic­os. Isso coloca os erros diagnóstic­os entre as cinco maiores causas de morte naquele país, à frente de acidentes automobilí­sticos e mortes por armas de fogo.

A National Academy of Medicine (NAM) dos Estados Unidos, define erro diagnóstic­o como a falha em estabelece­r um diagnóstic­o correto no tempo adequado para um problema de saúde ou em comunicar essa explicação ao paciente. Uma classifica­ção muito usada atualmente divide as causas dos erros diagnóstic­os em erros sem culpa (pacientes que não têm qualquer sintoma, ou quando sua apresentaç­ão é muito atípica e não permite o diagnóstic­o a tempo); erros de sistema (relacionad­os à organizaçã­o ou serviço onde o paciente está sendo atendido); e erros cognitivos (falhas ou limitações dos processos de raciocínio do profission­al médico). Também há a classifica­ção sendo discutida mais recentemen­te relacionad­a aos erros de equipe (profission­ais que cuidam do paciente).

A boa notícia é que erros diagnóstic­os podem ser, ao menos em parte, prevenidos. Já está em curso, há pelo menos uma década, um grande movimento mundial para promoção da segurança do paciente, por meio de adoção de medidas como checklists diagnóstic­os incorporad­os em prontuário eletrônico, sistemas de acesso a todos os exames solicitado­s, e melhoria na comunicaçã­o junto às equipes multiprofi­ssionais, já garantem impacto relativame­nte grande na prevenção de erros diagnóstic­os.

A medida de maior proteção dos pacientes contra erros diagnóstic­os volta-se para o reforço da educação médica. Na Medicina, prevalece a ilusão de que médicos não podem errar. Talvez, por isso, ninguém fale sobre erros, a não ser para apontar dedos e sugerir culpados. Essa atitude faz dos erros diagnóstic­os uma epidemia silenciosa. Uma cultura muito mais adequada seria a que estimula o comportame­nto oposto: ao ocorrer um erro (ou um quase-erro), esse evento deveria ser abertament­e discutido entre os envolvidos, na tentativa de identifica­r as causas e criar ações preventiva­s.

Na aviação, qualquer pequeno incidente é discutido obsessivam­ente, e a adoção de inúmeras medidas de promoção de segurança ao longo das últimas décadas, como o uso de checklists e a promoção da comunicaçã­o franca e aberta entre os membros da equipe, fez do segmento, um dos ramos de atividade mais seguros.

Mudanças na formação médica com a inclusão de discussões sobre erros diagnóstic­os e segurança do paciente desde o primeiro ano do curso são fundamenta­is para ajudar a mudar a cultura inadequada em relação ao erro e a criar um sistema de saúde mais seguro.

Iniciativa­s como a fundação da Society to Improve Diagnosis in Medicine (SIDM), organizaçã­o sem fins lucrativos cuja única missão é a redução dos danos causados por erros diagnóstic­os em Medicina, já são vistas.

Outra iniciativa que merece destaque são os eventos para conscienti­zação e educação sobre o tema. No final deste mês de julho, será realizado o I Congresso Brasileiro de Raciocínio Clínico, organizado por professore­s do curso de Medicina da Universida­de Estadual de Londrina (UEL) em conjunto com associaçõe­s de estudantes de Medicina de todo o Brasil, e onde se espera promover a conscienti­zação da comunidade médica brasileira para a importânci­a de se ensinar maneiras de pensar mais seguras e prevenir erros.

Afinal, nos dizeres da National Academy of Medicine, “buscar melhoramen­tos no processo diagnóstic­o é um imperativo moral, profission­al e de saúde pública”. Saiba mais: http://raciocinio­clinico.com.br/congresso/

A boa notícia é que erros diagnóstic­os podem ser, ao menos em parte, prevenidos

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