Folha de Londrina

Episódio causou troca de acusações entre passageira e motorista de aplicativo em Londrina

- Isabella Alonso Panho Especial para a FOLHA

Um novo tipo de golpe praticado em carros de aplicativo ganhou visibilida­de em Londrina nas redes sociais. No início de junho, uma estudante publicou um relato de que teria sido vítima do chamado “golpe do cheiro” quando estava, por volta das 8 da manhã, indo para a faculdade. Segundo o relato da estudante, que pediu à Folha para não ser identifica­da, o motorista teria errado o caminho duas vezes. A princípio, ela não se preocupou. Contudo, no segundo equívoco, ele teria entrado em uma rua de terra sem saída, na zona oeste da cidade. “Eu senti um cheiro forte. Eu não sei explicar que cheiro que é esse, eu sei que senti um cheiro forte e comecei a não me sentir bem”, contou. Na hora, ela abriu a janela ao seu lado e desconfiou de que algo estranho estava acontecend­o. “Eu comecei a ficar tonta, a visão começou a ficar embaçada, eu sabia que não estava normal. Eu abri a porta e consegui sair correndo.”

A poucos metros do local, a vítima, que correu risco de desmaiar, conseguiu ajuda de um outro motorista de aplicativo, que a levou até a universida­de. Lá, ela recebeu os primeiros socorros. “Minha pressão estava 15 por 10, e eu não tenho problema de pressão alta. É o contrário, eu tenho problema de pressão baixa. Estava bem acima do meu normal”, conta. No mesmo dia, ela procurou a Polícia Civil e registrou boletim de ocorrência. Com a repercussã­o do caso, o motorista também procurou o órgão para narrar a sua versão dos fatos.

Segundo a vítima, logo após o depoimento prestado à Polícia, não houve encaminham­ento para a realização de exame toxicológi­co, o que é fundamenta­l nesse tipo de crime. Como explica a advogada criminalis­ta Carolina Sekiama, que atua em causas que envolvem violência de gênero, “os vestígios são essenciais para comprovar que a pessoa passou por alguma situação anormal”. “Por mais que a palavra da vítima seja importante, os vestígios tendem a desaparece­r em muito pouco tempo nesse tipo de situação”, explica.

Caso a vítima não consiga passar diretament­e pelo IML (Instituto Médico Legal) a tempo, os exames feitos na rede particular também servem como prova. “A mulher pode, por si própria, procurar um laboratóri­o que faça exame toxicológi­co e explicar para o profission­al o que aconteceu, para que esse vestígio não seja perdido”, orienta Sekiama.

A advogada também relembra que, muitas vezes, o IML pode não realizar o exame específico que é necessário para comprovar a presença de certas substância­s no organismo.

Por se tratar de uma nova modalidade de golpe, ainda não há informaçõe­s oficiais sobre como ele seria feito – qual é a substância utilizada e como o motorista não se contamina. A Polícia Civil de Londrina está acompanhan­do o caso e, por ora, não comentará as investigaç­ões. Segundo o órgão, esse é o primeiro caso formalizad­o em Londrina. A Polícia Militar também afirmou que não possui registros de ocorrência­s dessa natureza na cidade.

REVITIMIZA­ÇÃO

Depois que o relato da estudante viralizou nas redes sociais, ela recebeu muitas mensagens de apoio, mas também de revolta com a sua postura. “Eu recebi muita mensagem boa, de mulheres me agradecend­o, porque também andam com carro de aplicativo”, conta a vítima. Por outro lado, “teve gente vindo me xingar, dizendo que eu queria ganhar seguidor”. “Nessa situação, eu quero mais é que parem de me seguir. Falaram até que eu fiz isso porque eu não tinha dinheiro para pagar”, lamenta. No dia seguinte ao fato, motoristas de aplicativo protestara­m na frente da universida­de da vítima. A Polícia Militar acompanhou situação.

OUTROS CASOS

Apesar de os registros oficiais não terem casos semelhante­s, após a viralizaçã­o do relato, outras vítimas apareceram. Uma outra estudante, que pediu para não ser identifica­da, contou à FOLHA que sofreu o mesmo tipo de golpe em 2018, quando voltava do trabalho.

Perto da casa dela, a jovem ouviu um barulho de spray e um cheiro doce e forte. Em seguida, o motorista aumentou o som do carro. “Foi uma sequência que não sai da minha cabeça”, conta. Os sintomas foram imediatos e semelhante­s ao caso deste ano: “Meu olho começou a fechar e eu sentia que meu corpo já estava mole. Eu ia desmaiar”.

Para não perder os sentidos, a estudante relata que “estava com uma jaqueta na mão”. “Na hora que meu corpo começou a escorregar no banco, eu coloquei a jaqueta no meu nariz e tampei. Eu respirava o menos possível. Eu não sentia minha perna, não sentia meu braço, começou a formigar”, conta a vítima.

O pai da jovem já a esperava em frente de casa. Ela saiu do veículo ainda em movimento. O motorista pôs a cabeça para fora e desejou que ela aproveitas­se o fim de semana. “Eu tive certeza absoluta de algo tinha acontecido ali. Ele falou num tom malicioso, nojento.” Na época, ela se sentiu muito confusa e desamparad­a, sobretudo pela falta de informaçõe­s sobre esse tipo de golpe. Demoraram duas semanas para que ela conseguiss­e contar o que aconteceu para a mãe. “Eu achava que estava louca”, relembra.

A pedido da Folha de Londrina, a empresa para a qual o motorista de aplicativo trabalha se manifestou por meio da seguinte nota: “Com relação ao que vem sendo chamado de “golpe do cheiro”, a única denúncia dessa natureza relativa a viagens no aplicativo da empresa que já teve a investigaç­ão concluída pela Polícia Civil, até onde temos conhecimen­to, ocorreu em Canoas (RS) e o caso foi encerrado após o inquérito policial, já que, de acordo com as autoridade­s, não houve elementos de prática de crime. Em outro caso, no Rio de Janeiro, o laudo pericial atestou que não foram encontrada­s substância­s de natureza tóxica, perigosa ou nociva. De qualquer forma, a empresa trata todas as denúncias com a máxima seriedade e avalia cada caso individual­mente para tomar as medidas cabíveis, sempre se colocando à disposição das autoridade­s competente­s para colaborar, nos termos da lei”.

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