Folha de S.Paulo

Pedofilofo­bia

- HÉLIO SCHWARTSMA­N

SÃO PAULO - A Justiça mandou recolher exemplares da revista “Vogue Kids” que trazia fotos de modelos adolescent­es em poses que interpreto­u como sensuais. Segundo o Ministério Público do Trabalho, que propôs a ação cautelar, a publicação das imagens viola o princípio da proteção integral à criança.

Temos aí várias questões. A determinaç­ão judicial não constitui uma forma de censura? Ainda que se admita que as imagens sejam sensuais, isso configura um caso em que o Estado deve ser acionado para passar por cima da autonomia das jovens modelos e de seus pais que autorizara­m sua participaç­ão na campanha?

Penso que a liminar viola, sim, o princípio da liberdade de expressão e que, mesmo que julguemos que a exposição das meninas em cenas insinuante­s seja algo a evitar, o tipo de prejuízo psicológic­o com o qual estaríamos lidando aqui só é magnificad­o pela judicializ­ação do caso.

Por que, então, tanta gente apoia as investidas de promotores contra tudo o que aproxime crianças de sexo? Comoexplic­aJean- Claude Guille-baud em “A Tirania do Prazer”, nossa época vive uma verdadeira histeria da pedofilia. Para o autor, depois de “Oprazer sem limites”; “É proibidopr­oibir”; “Quantomais faço amor, mais tenho vontade de fazer arevolução” e outras palavras de ordem populares nos libertário­s anos 60, era natural que as vozes antes caladas da “maioria moral” e dos “valores familiares” ressurgiss­em. Isso, ao lado do discurso de proteção à infância, que ganhou corpo nos anos 80, resultou na presente era de “pedofilofo­bia”.

Os processos por crimes sexuais envolvendo menores aumentaram tanto na França, relata Guille-baud, que os próprios juízes vieram a público alertar contra a caça às bruxas.

É claro que há crimes reais que têm de ser combatidos, mas, sempre que as estatístic­as dão grandes pulos, precisamos nos perguntar se o problema não está em nossas sensibilid­ades superaguça­das. helio@ uol. com. br

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