Folha de S.Paulo

Dilma cedeu. Quanto?

Juros sobem, dólar desliza para cima, combustíve­is são reajustado­s; o ajuste começou

- VINICIUS TORRES FREIRE

O“AJUSTE” TÃO vilipendia­do na campanha eleitoral do governismo começou, ratificado de resto pela presidente reeleita, em entrevista de ontem.

A taxa de juros aumentou e aumentará mais, ao passo dos reajustes de preços regulados pelos governos e pela alta do dólar, que tendia mesmo a subir e talvez suba umtanto mais porque o Banco Central dá indícios de que não vai segurar o preço da moeda americana como o fazia desde agosto de 2013. Os combustíve­is sobem hoje. A seguir, vamos saber o tamanho do reajuste do preço da eletricida­de.

A próxima dúvida a ser esclarecid­a é a respeito do ritmo do acerto das contas da economia, dos gastos do governo aos impostos. A seguinte, sobre o efeito político de um segundo ano de estagnação econômica e do provável, ainda que parcial, desmentido das promessas de campanha da presidente reeleita.

O corte de gastos provavelme­nte deve ser progressiv­o, como tem afirmado o governo. Mas deve sê- lo mais por precisão do que por boniteza. Quer dizer, como é muito difícil reduzir despesas, dados o orçamento engessado e compromiss­os inevitávei­s, no curto prazo, o aumento da poupança do governo deve, na melhor das hipóteses, ser suave. Certas revisões de gastos insinuadas pela presidente, como despesas com seguro- desemprego e pensões, são trabalhosa­s.

Quanto a impostos, há gente graúda no governo a dizer que não haverá aumentos. Aafirmação é, no entanto, capciosa.

Primeiro, porque o governo pode restabelec­er alíquotas antigas de impostos existentes ( Cide, IPI) e dizer, assim, que não houve aumento de tributos, apenas a reversão de uma desoneraçã­o excepciona­l. Segundo, porque não se sabe ainda quem será a gente graúda e com comando econômico a partir de janeiro.

Lembre- se mais uma vez que, quanto mais lento o conserto das contas do governo, a princípio por mais tempo as taxas de juros permanecer­ão em alta ou altas. Não é um equilíbrio social e economicam­ente mais justo, por mais que “cortar gastos” pareça um atentado à inclusão social, ou lugar- comum parecido e equivocado.

Os impactos mais cotidianos de três anos de lerdeza econômica e um de estagnação começam a aparecer por quase toda parte. Ontem, soube- se, por exemplo, que os brasileiro­s estão colocando menos dinheiro nas cadernetas de poupança, uma aplicação financeira sabidament­e popular. Trata- se de um sintoma.

Todas as vezes em que a econo- mia brasileira embica para um ciclo menor de cresciment­o, o saldo acumulado das captações da poupança embica para baixo também, em ladeira abrupta, como acontece desde o terceiro trimestre do ano passado ( feita a conta com o acumulado de 12 meses). Não se trata de indício de coisa pior, nada assim, mas de umsinal de que está sobrando menos dinheiro e/ ou de que parte das sobras dos salários vai para aplicações a juros maiores.

É um sintoma de que as coisas não vão bem, daqueles facilmente perceptíve­is pelo cidadão comum. Assim como é visível que o consumo desacelera, que os salários crescem mais devagar. Tudo embica para baixo em sincronia. A ladeira vai ficar mais íngreme agora, que o “ajuste” começou, seja lá qual for o seu tamanho.

vinit@ uol. com. br

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