Folha de S.Paulo

existe cultura em SP

Pesquisa com 8.000 pessoas de 21 cidades paulistas neste ano indica que educação tem maior peso que renda para hábitos culturais

- DE SÃO PAULO KARLA MONTEIRO

Oporteiro é apaixonado pelo pintor italiano Caravaggio e recita Machado de Assis. Louco por Roberto Carlos, o despachant­e batizou quatro filhos comabênção do Rei em pessoa. O estudante tem um princípio: só lê livros emprestado­s. E a avó escritora é letrada em tecnologia.

Os personagen­s acima são estatístic­a. Pesquisa da JLeiva Cultura e Esporte, consultori­a especializ­ada em políticas culturais, acaba de traçar o mapa do consumo cultural no Estado de São Paulo.

Foram ouvidas 7.939 pessoas, entre abril e maio deste ano, em 21 cidades com mais de 100 mil habitantes. Oobjetivo é prover de informaçõe­s gestores culturais e fomentar o debate que auxilie as políticas públicas para o setor.

“Já há algum tempo se sabe que, para desenvolve­r hábitos de cultura, os fatores mais influentes são educação e renda. Mas queríamos mais”, diz João Leiva, diretor da JLeiva.

“Diz- se, por exemplo, que as pessoas não vão ao teatro. Mas, então, quantas vão de fato ao teatro? A ideia era ter o perfil dos consumidor­es”, explica Leiva, que encomendou a pesquisa ao Datafolha. Os dados estão no site da consultori­a ( jleiva. com. br). ILHAS Classe C ou classes Ae B, quem consome mais cultura? Quem vai ao cinema, jovens ou idosos, pobres ou ricos? Os paulistas frequentam mais biblioteca­s ou museus? Segundo Leiva, a pesquisa trouxe surpresas.

Mostra que 69% dos entrevista­dos da classe C com ensino superior frequentar­am biblioteca­s no último ano, contra 40% dos entrevista­dos das classes A/ B com ensino médio. Quando o hábito é cinema, a diferença diminui, 82% na classe C e 76% nas classes A/ B; museus, 42% e 29%, respectiva­mente. “Este dado não é conclusivo, mas pode indicar que educação tem peso maior do que renda”, analisa Leiva.

Outra dado que surpreende­u refere- se à existência — ou não— de equipament­os de cultura nas cidades.

“São José do Rio Preto aparece como o lugar onde mais se vai ao teatro. Também é a cidade onde acontece o maior festival teatral do Estado [ o FIT]”, comenta Leiva. “Ointeresse por música clássica em Tatuí é elevado. Lá está o principal conservató­rio de São Paulo. Já Guarulhos, que tem pouca oferta, está abaixo da média em todos os quesitos”.

O cinema ocupa o topo da preferênci­a no Estado — 60% dos habitantes foram ao cinema no último ano. Em seguida estão festas populares ( 47%) e shows ( 46%). Biblioteca­s aparecem com média de 36%; teatro de 28% e museus, de 26%. As atividades commenor frequência são espetáculo­s de dança ( 19%), saraus ( 14%) e concertos ( 12%).

O estudante de pedagogia Eduardo Alencar, 21, costuma frequentar livrarias. Gosta de passear entre as estantes de livros, perambular ao léu. Mas não compra nada. Por dois motivos: nunca sabe o que levar para casa e, principalm­ente, não tem dinheiro para investir errado.

“Pegar emprestado tem vantagens. Você não gasta e alguém escolhe por você. O livro da minha vida eu descobri pegando emprestado”, conta.

“Disse para umaamigaqu­e queria ler algo que me fizesse chorar e rir. Ela passou o olho na estante e puxou um exemplar de ‘ OMeu Pé de Laranja Lima’, de José Mauro de Vasconcelo­s. Li quatro vezes seguidas.”

Eduardo nasceu no Jardim Miriam, zona sul de São Paulo. Até os 15 anos, nunca tinha lido um livro. O primeiro caiu na sua mão por acaso.

Convidado por umaamiga, foi conhecer a biblioteca de um projeto social voltado para literatura, chamado Os Escriturei­ros de Parelheiro­s. Ali, catou um livro.

“Li ‘ Casebre do Fantasma’, da Luci Guimarães Watanabe. Comecei a descobrir o prazer de ler”, diz.

Desde então, elegeu duas autoras favoritas: Ruth Rocha e Ana Maria Machado. Não gosta de livros da moda. Cita dois destes que leu e detestou: “Crepúsculo”, de Stephenie Meyer, e “A Culpa É das Estrelas”, de John Green.

E adora ser surpreendi­do por autores que não conhece. “Acho maravilhos­o quando cai umlivro desurpresa naminha mão. Livros têm que circular, têm que ter vida. Entre o meu grupo de amigos, é um troca- troca”, comenta. ( KM)

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LITERATURA 66% dos pesquisado­s leem livros emprestado­s
Danilo Verpa/ Folhapress LITERATURA 66% dos pesquisado­s leem livros emprestado­s

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