Folha de S.Paulo

Dilma e suas alegrias

- VINICIUS TORRES FREIRE vinit@ uol. com. br

PARA QUASE qualquer lugar da economia para onde se olhe, há motivos de aflição sobre o presente e ansiedade sobre o futuro próximo. Ementrevis­tas ou discursos, a presidente Dilma Rousseff costuma citar animadamen­te dois aspectos melhores da economia: o desemprego baixo e o investimen­to estrangeir­o “na produção” ( investimen­to estrangeir­o direto, o IED).

Na conta do IED estão os dinheiros que entram no Brasil destinados à compra ou à criação de empresas e empréstimo­s entre matrizes e filiais. Esse pedaço das contas externas do país vai de fato bem.

Quando instada a falar sobre a baixa confiança dos empresário­s ou sobre a queda dos investimen­tos “domésticos”, a presidente retruca com o IED grandão.

Apesar de, em relação ao tamanho da economia, o IED ter tido dias melhores, nos últimos 12 meses até setembro entraram US$ 66,4 bilhões no país, equivalent­es a 2,9% do PIB. No ano passado, foram US$ 64 bilhões. Trata- se de quantidade próximas das máximas históricas.

Bom? É um indício de que empresário­s não residentes acreditam que é ainda é possível fazer dinheiro no Brasil, que o país tem um mercado de bom tamanho, que não há colapso à vista.

Ruim? Economista­s críticos do governo alegam que grandes empresas estrangeir­as vêm para cá porque o mercado é protegido da concorrênc­ia. Vêm para explorar taxas de rentabilid­ade muito altas, produzir bens e serviços inferiores e ca-

Presidente sempre cita investimen­to estrangeir­o como prova de que o Brasil resiste bem. Bom?

ros, exportar pouco ou nada.

Em resumo, vêm para explorar e perpetuar ineficiênc­ias da economia brasileira.

Outra especulaçã­o razoável seria dizer que o IED cresceu e mantevese em níveis altos depois de 2010 porque há capital barato sobrando, dada a lerdeza econômica mundial.

SERVIÇOS FRAQUEJA

No Brasil, apesar do ritmo decli- nante do PIB, o consumo ainda crescia a um ritmo forte, assim como o setor de serviços. Aliás, desde 2009, o IED cresce mais no setor de serviços: financeiro­s, comércio, de utilidade pública ( eletricida­de, gás etc.), teles, entre os maiores, mas também em imóveis, transporte, educação e tecnologia de informação.

Osetor de serviços começou a fraquejar também. A renda da população cresce bem mais devagar. Talvez nada neste ano.

O IED é uma forma de financiame­nto do nosso deficit externo. Compramos mais bens e serviços do que vendemos lá fora. A diferença precisa ser financiada por “entra- das de dólares”, por meio de IED ou aplicações financeira­s. Quanto menos IED, pior a qualidade do financiame­nto do deficit. O IED, de 2,9% do PIB, já não financia nosso deficit externo, de 3,7% do PIB.

Em outros tempos, deficit externos grandes e reservas pequenas levavam o Brasil a crises cambiais ( falta de dólares), o que resultava em desvaloriz­ações brutais, mais inflação e visitas ao FMI.

Agora, a economia é menos desarrumad­a, temos reservas enormes e, inédito, não temos dívida externa, na prática.

Melhor assim. Mas viradas no fluxo internacio­nal de capitais por vezes são brutais e rápidas. E folga nas reservas pode induzir negligênci­a. Como há mais gordura para queimar, pode- se fazer besteira por mais tempo.

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