Folha de S.Paulo

Mais importante no filme de Mário Peixoto é a beleza de suas imagens

- INÁCIO ARAUJO

FOLHA

“Limite” é um filme e seu mito. Ou seus mitos. O primeiro: o da exibição, mal recebida pelo público, mas que mobilizou a intelectua­lidade, sobretudo carioca. Ainda assim, o autor, Mário Peixoto, teria prometido que o filme nunca mais seria visto no Brasil.

Não deve ter sido, pois Vinicius de Moraes escreveu que em 1942 Orson Welles impression­ou-se vivamente com o que viu. Segue-se a história da famosa carta de Eisenstein, cheia de elogios ao filme, que mais tarde se revelaria uma invenção do próprio Mário.

Depois, existe a única cópia preservada, que graças a Saulo Pereira de Queiroz se tornaria a base do restauro finalmente entregue nos anos 1970, que tornou possível a difusão dessa obra-prima.

Os mitos em torno de “Limite” não terminam por aí. Mas fiquemos com o filme. Obra do cinema mudo, em preto e branco, não é um filme que tenha um enredo à maneira tradiciona­l.

Ali se encontram três personagen­s, um homem e duas mulheres, em situação limite. Encontram-se em um barco à deriva. Suas trajetória­s são mostradas em traços elípticos, sintéticos.

O espectador fará um bem a si próprio não se preocupand­o em “entender” direitinho o que acontece. Importa mais mergulhar na beleza das imagens, seguir-lhe os ritmos, acompanhar os movimentos de câmera inventivos e audazes de Edgar Brazil, as fusões lentas e ricas.

Não que não haja enredo. Ele se revela, porém, aos poucos. Quem se entregar ao filme dificilmen­te deixará de se encantar com “Limite”, ainda que o novo restauro, realizado em Bolonha, tenha sido comparado desfavorav­elmente ao feito aqui mesmo na Cinemateca Brasileira.

Teria havido um problema na projeção em Ouro Preto (onde o restauro estreou)? O próprio restaurado­r italiano reclamou da projeção? Ou ele teria sido encaminhad­o a partir de um estudo histórico incompleto? Enfim, não é impossível que hoje comece a nascer um novo mito em torno de “Limite”. DIREÇÃO Mário Peixoto PRODUÇÃO Brasil, 1931, livre MOSTRA qua. (28), às 20h30 (Cinemateca) AVALIAÇÃO ótimo

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