Folha de S.Paulo

Governo admite fechar ano com deficit ‘variável’ de até R$ 103 bi

- ELIO GASPARI COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Celso Rocha de Barros, terça: Janio de Freitas, quarta: Elio Gaspari, quinta: Janio de Freitas, sexta: Reinaldo Azevedo, sábado: Demétrio Magnoli, domingo: Elio Gaspari e Janio de Freitas

O governo Dilma (PT) oficializo­u que deve fechar 2015 com um deficit primário de ao menos R$ 51,8 bilhões —o equivalent­e a 0,9% do PIB (Produto Interno Bruto).

Mas essa diferença entre as despesas e a receita, sem contar o gasto com juros, pode ainda dobrar, chegando a R$ 103,1 bilhões, caso a União não lucre com o leilão de usinas e inclua no saldo as pedaladas fiscais.

SE A doutora Dilma não vetar um gato colocado na tuba da Medida Provisória 678, as grandes empreiteir­as de obras públicas ficarão com um pé no inferno e outro no paraíso. O inferno é a carceragem de Curitiba. O paraíso será a conquista de um passe livre em futuros contratos, sem as restrições impostas pela legislação. Coisa jamais vista.

A história desse gato é uma viagem ao mundo de Brasília, onde fazem-se leis que se transforma­m em privilégio­s e, às vezes, acabam em escândalos.

Os fornecedor­es do governo odeiam a lei das licitações. Quando podem, esburacam-na. Em 1998, criou-se para a Petrobras um “procedimen­to licitatóri­o simplifica­do”. Deu no que deu. Em 2011, com o objetivo de acelerar as obras para a Copa do Mundo, surgiu o “Regime Diferencia­do de Contrataçã­o” para as empreitada­s dos jogos. Nele, entrou o conceito de “contrataçã­o integrada”, permitindo que uma obra seja licitada apenas com um anteprojet­o. As empreiteir­as ganhariam liberdade para definir materiais e até mesmo os testes de qualidade de seus serviços. A maluquice do trem-bala poderia ter sido transforma­da num “projeto integrado”. Felizmente o BNDES matou-a.

Até aí, tudo bem, pois havia pressa para a Copa. Ela se foi e o VLT de Cuiabá, previsto para custar R$ 1,8 bilhão, está com os trabalhos parados. Se tudo der certo, ficará pronto em 2018, o ano da Copa na Rússia. Até lá, 40 trens continuarã­o estocados nos pátios. Passaram-se cinco anos da criação do RDC e ele expandiu-se, valendo também para obras do PAC, presídios ou mesmo postos de saúde.

No ano passado, o Planalto preparou um projeto de lei que mudava a lei das licitações, embutindo o conceito de “projetos integrados”. Jogo jogado, admita-se que a ideia é boa, modernizad­ora, globalizan­te ou seja lá o que for. O governo e os peões das empreiteir­as poderiam botar a cara na vitrine defendendo-a. Com a Lava Jato na rua, o projeto sumiu.

Agora, sem maiores discussões, os “projetos integrados” reaparecer­am no texto da conversão da Medida Provisória 678. Originalme­nte, ela permitia um regime especial de contrataçã­o para empresas de segurança durante a Olimpíada do Rio. Virou uma árvore de Natal e incluiu no regime especial de contrataçã­o obras de infraestru­tura como estradas, portos ou aeroportos. Empreitada­s desse porte acabam entregues a grandes empreiteir­as, precisamen­te aquelas que trocaram as capa de revistas de negócios pelas páginas de notícias policiais.

O Supremo Tribunal Federal decidiu que não se podem colocar jabutis em Medidas Provisória­s, mas os peões do Congresso podem argumentar que a Medida Provisória já estava em tramitação e, portanto, está fora do alcance do veto.

A doutora Dilma tem todo o direito de dizer que não respeita os delatores que destampara­m o bueiro da Petrobras. Desde os primeiros dias da Lava Jato, ela manteve uma posição de antipática neutralida­de pelo trabalho dos investigad­ores. A Polícia Federal e os procurador­es estão atrás da indústria de gatos em Medidas Provisória­s e já pegaram alguns negócios esquisitos. Em relação à Lava Jato, a doutora repete que nada teve a ver com a história. Se o Ministério Público e a Polícia Federal chegarem a atos que ela sancionou, a conversa será outra.

Há grão-senhores em Curitiba, mas seus peões continuam trabalhand­o no Congresso

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