Folha de S.Paulo

O que eles veem

- JANIO DE FREITAS COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Celso Rocha de Barros, terça: Janio de Freitas, quarta: Elio Gaspari, quinta: Janio de Freitas, sexta: Reinaldo Azevedo, sábado: Demétrio Magnoli, domingo: Elio Gaspari e Janio de Freitas

O IMPEACHMEN­T de Dilma Rousseff e a cassação de Eduardo Cunha estão agora entrelaçad­os, mais distantes no calendário, mas com futuros separados e perspectiv­as diferentes.

O pedido de cassação de Eduardo Cunha, por iniciativa do PSOL e da Rede de Marina, demorou 15 dias para ir da Mesa da Câmara ao Conselho de Ética, onde chegou ontem. É um prenúncio. Os prazos do Conselho e as férias de verão do Congresso, a começarem em 22 de dezembro, não se entendem bem com a decisão sobre Cunha. Não há previsão do que o relator pretenda, entre inquirição de testemunha­s e coleta de documentos, para formar sua proposta ao Conselho. Não é provável, portanto, que mesmo nessa instância preliminar haja decisão antes do recesso parlamenta­r.

Remota embora, no entanto pode haver. Se, porém, houver e for pela cassação de Eduardo Cunha, a proposta ainda terá de passar à instância seguinte, o plenário que efetivará a medida extrema ou a absolvição. Logo, mesmo que o Conselho de Ética submeta a proposta de cassação ao plenário, só daqui a mais de três meses haveria a decisão final.

Pressa, ou desejo mal controlado, produziu ontem a notícia “Câmara recomenda a Cunha dar aval ao impeachmen­t”. Falta muito para a Câmara chegar à etapa de iniciativa­s e decisões. A pedido de Eduardo Cunha, assessores teriam concluído parecer que aprova o embasament­o jurídico do pedido de impeachmen­t de Dilma assinado por Hélio Bicudo, Reale Jr. e Janaína Paschoal. Mas também há a informação —aliás, citada de raspão pelo “Globo”— de um parecer em sentido contrário e também pedido por Cunha. Para dar ares jurídicos à decisão que tome, de encaminhar ou arquivar o requerimen­to de impeachmen­t. Duplicidad­e sen- sata, mas sobretudo típica de Eduardo Cunha, o astuto.

Nestes dias de “nova mídia”, depois de ler o noticiário é recomendáv­el recorrer aos mais bem informados para saber qual das informaçõe­s contraditó­rias é mais confiável. Ou menos inconfiáve­l. Do almoço na casa de Eduardo Cunha, anteontem, aquele jornal do Rio publicou que os presentes ouviram dele que sua decisão, sobre encaminham­ento do pedido de impeachmen­t, “dependerá de um fator externo”. Qual seja, haver ou não pedido do procurador-geral da República ao Supremo para o afastament­o de Cunha. A medida o levaria a agir contra Dilma. Mas também se podia ler que os outros presentes nada ouviram sobre o procurador-geral e sobre tal assunto.

É óbvio que Eduardo Cunha fez do pedido de impeachmen­t uma arma de muitas utilidades. Mesmo inexistind­o submissão do procurador­geral ao governo ou a Dilma, associá-los é a maneira encontrada por Cunha para justificar sua manipulaçã­o do impeachmen­t. Mas, sem contrariar esse jogo, da sua e da parte do governo há sinais de novos conceitos mútuos. Os quais, se consolidad­os, vão se refletir em disposiçõe­s também mútuas.

Em prazos, as perspectiv­as para Dilma, quanto ao pedido dos três juristas, são mais ou menos as de Cunha. Mesmo o potencial de um processo parlamenta­r provenient­e do Tribunal de Contas da União, sobre as “pedaladas”, é pequeno, já por não se tratar de crime de responsabi­lidade, como exigido para impeachmen­t.

Logo, tudo no Brasil está e continuará, ainda por meses, pendurado em dois assuntos tão vivos quanto mortos. Ainda que se resolvam algumas pendências do governo no Congresso, para o desajuste econômico, para os próximos meses não se vislumbra promessa de situação definida, em qualquer sentido.

Afora uma hipótese, merecedora de expectativ­a. Na Procurador­ia Geral da República aumenta a confiança em que seu material sobre Eduardo Cunha leve a muito mais do que processos comuns por recebiment­os ilegais, evasão de divisas, lavagem e contas não declaradas. Nas suas consideraç­ões, a Procurador­ia nem se preocupa com férias parlamenta­res.

Rodrigo Janot leu que o verão vai ser quente como poucos. E não havia outra notícia dizendo o oposto.

Tudo está e continuará pendurado em dois assuntos: o impeachmen­t de Dilma e a cassação de Cunha

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