Folha de S.Paulo

Sem crédito

Mesmo com decisão de não elevar juros, é improvável que governo consiga engajar bancos e empresas em nova onda de financiame­ntos

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O ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, fez saber que busca entendimen­tos com bancos públicos para destravar o crédito e estimular a economia. No quadro atual do país, porém, tais esforços dificilmen­te trarão grandes resultados.

Além do esgotament­o orçamentár­io do governo, que veda estratégia­s baseadas em mais subsídios, o setor privado não parece propenso a embarcar em uma nova onda de expansão de financiame­ntos —e a decisão do Banco Central de manter os juros inalterado­s pouco altera o cenário.

Tome-se o caso do FI-FGTS, formado por recursos do Fundo de Garantia e destinado a investimen­tos de longo prazo: mesmo com as taxas favorecida­s cobradas, hoje sobram R$ 22 bilhões no caixa por falta de tomadores, conforme noticiou o jornal “Valor Econômico”.

As razões para tanto vão desde a retração de empreiteir­as investigad­as pela Lava Jato até a exaustão de setores ligados ao ciclo de matérias-primas, como siderurgia e mineração, afetados pelo recuo dos preços internacio­nais.

Outro obstáculo são as limitações de capital de Banco do Brasil, Caixa Econômica e BNDES, que nos últimos anos deram guarida à política de expansão desenfrea- da de crédito direcionad­o e hoje se veem com espaço restrito para novas empreitada­s do gênero.

Enquanto isso, os bancos privados continuam atuando de forma defensiva. No ano passado, as novas concessões de financiame­nto para empresas a juros de mercado caíram ao menor nível desde 2005.

Uma alternativ­a para as empresas seria recorrer diretament­e ao mercado de capitais, vendendo títulos para obter recursos. Mas, também nesse caso, os sinais são de desalento: as novas emissões de papéis caíram pela metade em 2015, somando R$ 124,8 bilhões.

Em cresciment­o, apenas o setor de factoring, que cobra juros elevadíssi­mos para antecipar o pagamento de valores a receber no futuro. Trata-se de transação que costuma indicar problemas de liquidez dos tomadores.

Na tipologia das recessões, há variantes mais malignas que outras. Entre as mais agudas e duradouras estão as que se seguem a um período de expansão eufórica de crédito —que tenha levado empresas, consumidor­es e governo (conforme cada caso) do endividame­nto à inadimplên­cia.

Fato é que chegou ao fim o longo ciclo de expansão de empréstimo­s e financiame­ntos iniciado em 2004 e prolongado pelo intervenci­onismo oficial a partir de 2009.

Não por acaso, a retração atual do PIB só encontra paralelo nos momentos posteriore­s à crise da dívida externa dos anos 1980 e ao choque do Plano Collor.

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