Folha de S.Paulo

Em Davos, Argentina vira exemplo ao Brasil

Depois de 12 anos longe do fórum econômico global sob os Kirchner, país recebe holofotes com governo Macri

- CLÓVIS ROSSI

Presidente diz que defenderá democracia e presos políticos na Venezuela em ‘todas as instâncias regionais’

Um dos mais conhecidos analistas econômicos do Brasil, frequentad­or assíduo do Fórum de Davos, pede o anonimato para produzir a mais perfeita e irônica visão de como é vista, pela elite mundial, a ascensão de Mauricio Macri à Presidênci­a argentina:

“A melhor notícia para o Brasil nos últimos tempos é Mauricio Macri”, ironiza. E explica: seu exemplo servirá de estímulo para que o Brasil faça as reformas há tanto prometidas e sempre adiadas.

Pelomenose­mumponto, Macri quer mesmo servir de modelo: na defesa dos os presos políticos na Venezuela e na pregação por democracia e direitos humanos.

“Em todas as instâncias a que irei nos próximos dias ou meses, vou falar disso”, disse o presidente em encontro com os jornalista­s do Internatio­nal Media Council, criado pelo Fórum Econômico Mundial.

Sua chanceler, Susana Malcorra, explicitou as instâncias e são realmente todas as regionais: Comunidade de Estados Latino-Americanos e do Caribe, Unasul, Organizaçã­o dos Estados Americanos.

A julgar pelo entusiasmo de Macri, ele não é modelo só para o Brasil: o presidente acha que, “de repente, está todo o mundo indo na mesma direção” em relação à Venezuela. Menos o Brasil, ressalvou, “pelo problema que é a fronteira”, sem detalhes.

O modelo que Macri vendeu na campanha eleitoral e nos seus primeiros 40 dias de governo atraiu de fato a atenção de Davos, a ponto de ter mobilizado até Martin Wolf, principal colunista do “Financial Times” e um dos mais respeitado­s do mundo, para a entrevista desta quinta (21).

“A Argentina está interessan­te”, explicou Wolf.

Qual é o roteiro que Macri vendeu nos seus dois dias no encontro anual-2016 do Fórum Econômico Mundial?

Responde o próprio presidente: “Um país aberto, confiável, com regras estáveis para todos”.

Música para os ouvidos dos executivos que formam a clientela básica de Davos, dos quais a antecessor­a de Macri, Cristina Kirchner, fugiu durante os 12 anos de reinado dos Kirchner.

Já Macri veio com um time completo de auxiliares, que trouxe ao seu encontro com os jornalista­s, algo inusitado nesse modelo de conversa.

Deixou até que respondess­em, junto com ele, além da chanceler Susana Malcorra, o ministro da Economia, Alfonso Prat-Gay, e o peronista Sergio Massa, derrotado no pleito que, em segundo turno, entronizou Macri.

Permitiu-se até uma brincadeir­a com o impecável inglês de Prat-Gay, que serviu de tradutor ao espanhol de Massa: “Se você não der certo na economia, já tem lugar como tradutor”. ABUTRES Novidades na entrevista não surgiram, mas serviram para confirmar a moderação do novo presidente, um contraste até forçado com o estilo belicoso de Cristina.

Anunciou, por exemplo, a intenção de acertar as contas com os chamados “fundos abutre”, que estão impedindo a Argentina de entrar no mercado de crédito.

Se houver o acerto (“tão rápido e justo quanto possamos obter”, ressalvou Prat-Gay) e o crédito voltar, a Argentina poderá dobrar a produção de alimentos, diz Macri.

Com o premiê britânico, David Cameron, com quem se reuniu no mesmo dia, Macri repetiu a histórica reivindica­ção argentina pela soberania sobre as ilhas Malvinas, mas sem deixar de “sentar-se para discutir sobre tudo”.

Macri manteve 19 reuniões com líderes políticos e empresaria­is em Davos, sempre com a mensagem: “A Argentina está madura para voltar ao mundo”.

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