Folha de S.Paulo

Barragem tinha mais lama que o divulgado por empresa

Engenheiro diz à PF que quantidade maior poderia compromete­r estabilida­de

- ESTÊVÃO BERTONI

Projetista de Fundão, em Mariana (MG), alertou a Samarco em 2014 sobre uma trinca na represa

A quantidade de lama depositada pela Samarco no reservatór­io de Fundão, que ruiu em novembro, em Mariana (MG), era maior do que a divulgada pela empresa.

A informação consta do depoimento que o engenheiro Joaquim Pimenta de Ávila, que projetou Fundão, deu à Polícia Federal em dezembro.

Uma quantidade maior de lama, se não prevista, poderia compromete­r a estabilida­de da barragem, segundo o engenheiro, no depoimento.

“A Samarco informava que a proporção de lama para rejeito arenoso era 30% de lama para 70% de arenoso, mas, na prática, sempre foi 40% de lama para 60% de arenoso”, diz trecho do documento obtido pela Folha.

O rejeito é a parte não utilizada após o beneficiam­ento do minério.

Levantamen­to da reportagem com base em relatórios da Samarco mostra que, de 2009 a 2013, a mineradora produziu, em média, 15,8 milhões de toneladas de rejeito por ano, em Mariana. Desse total, 26%, em média, eram lama, e 74%, rejeito arenoso.

Barragens como a que se rompeu, construída com o próprio material do rejeito, precisam ter seu nível de água controlado, “pois senão começam a aparecer situações de risco”, disse Ávila à PF.

Por isso, a empresa instalava piezômetro­s, que medem a pressão da água no solo. Em casos preocupant­es, a estrutura ganhava reforço.

No sábado (16), a Folha revelou que Ávila disse à PF ter alertado a Samarco em 2014 sobre um princípio de ruptura, após o surgimento de uma trinca em um recuo que não estava em seu projeto.

Ávila foi projetista de Fundão até 2012, quando terminou seu contrato. Em 2014, voltou à Samarco para consultori­a. Ao ver a trinca, recomendou a instalação de ao menos nove piezômetro­s. A empresa afirma ter tomado as providênci­as necessária­s.

A PF indiciou a Samarco, a Vale, a VogBR, responsáve­l pelo último laudo de estabilida­de, e mais sete pessoas, sob suspeita de crime ambiental.

O presidente da Samarco, Ricardo Vescovi, e o diretor de operações, Kleber Terra, se afastaram dos cargos.

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