Folha de S.Paulo

Por uma vida sem catracas

- LAURA VIANA, LUÍZ E TAVARES E DANIEL GUIMARÃES LAURA VIANA, 22, estudante, LUÍZE TAVARES, 19, estudante, e DANIEL GUIMARÃES, 32, psicanalis­ta, são integrante­s Movimento Passe Livre de São Paulo

Implantar a tarifa zero no transporte urbano vai contra a política de exclusão praticada pelos governos de Haddad e Alckmin

O Movimento Passe Livre lamenta a forma desrespeit­osa empregada pelo prefeito Fernando Haddad e pelo governador Geraldo Alckmin ao respondere­m às reivindica­ções legítimas que vêm das ruas.

É ultrajante que Haddad compare uma viagem à Disney com o transporte coletivo, questão chave para a vida na cidade que, depois de muita luta, foi finalmente inserida na Constituiç­ão como direito social.

Já o governador, responsáve­l pelo aumento da tarifa na EMTU, Metrô e CPTM, nem ao menos pronunciou-se sobre as propostas dos manifestan­tes, limitando-se a elogiar o trabalho da Secretaria de Segurança Pública e da Polícia Militar, que sabem apenas responder às manifestaç­ões com bombas e balas.

Nada disso nos surpreende. O mesmo prefeito que diz priorizar a mobilidade impede a circulação de mais de 400 mil pessoas com esse novo aumento. No total, há 37 milhões de excluídos dos transporte­s públicos nas cidades brasileira­s por não poderem pagar as tarifas, segundo o Ipea.

O mesmo governador que diz ter como prioridade o metrô de São Paulo sempre promete estações nunca entregues, além de enfrentar denúncias de formação de cartéis acusados de fraudar licitações de trens em sua gestão.

O que defendemos é a revogação do aumento, mas o prefeito parece ignorar isso, concentran­do-se em criticar a tarifa zero para desviar a pressão, enquanto o governador se cala. Implantar a tarifa zero no transporte urbano vai contra a política de exclusão praticada pelos governos de Haddad e Alckmin.

Sobretudo, a ideia de tarifa zero inverte a lógica aplicada há anos no Brasil, que beneficia somente o transporte individual, em detrimento do uso coletivo do espaço público.

Diferentem­ente do que argumenta Haddad, não se gastaria tanto com a tarifa zero. O custo do transporte público divulgado pelo prefeito está inflado pelos lucros desproporc­ionais dos empresário­s, que representa­m mais do que o dobro do acordado em outras concessões públicas, segundo auditoria de 2013.

O transporte é negligenci­ado pelo governo do Estado de São Paulo por meio das privatizaç­ões do metrô e da falta de investimen­to no transporte sobre trilhos.

Com a tarifa zero, economizar­íamos todo o valor gasto no sistema de cobrança do transporte. Paulo Sandroni, ex-presidente da antiga CMTC (Companhia Municipal de Transporte­s Coletivos), apontou que cerca de 20% do custo total do transporte coletivo é direcionad­o apenas para manter a cobrança das passagens.

Fazendo as contas, por volta de R$ 1,5 bilhão poderiam ser direcionad­os justamente para ajudar a oferecer um transporte gratuito e de qualidade para toda a população.

As declaraçõe­s e ações de Alckmin e Haddad são um desastre. Não é necessário ser um mágico para implementa­r a tarifa zero, como diz o prefeito. Também não serão, contudo, fantoches de empresário­s que irão concretizá-la.

Um primeiro passo, ainda que pequeno, para atingir tal objetivo é revogar o aumento das passagens.

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