Folha de S.Paulo

Inflação e aperto no crédito causam 1ª retração do comércio desde 2003

Vendas encolhem 4,3% em 2015, pior resultado desde o início da série histórica do IBGE, em 2001

- BRUNO VILLAS BÔAS

Setor de móveis e eletrodomé­sticos encolhe 14% eé o principal responsáve­l pela contração do varejo

Desemprego em alta, inflação de dois dígitos e crédito restrito. Essa combinação freou o consumo e derrubou em 4,3% as vendas do varejo em 2015 —e nada indica uma retomada neste ano.

O resultado interrompe­u um ciclo de 11 anos de cresciment­o do varejo, a um ritmo médio de 7% ao ano. Foi a queda mais rápida do setor desde 2001, início da série da pesquisa do IBGE. O último ano em que o varejo teve queda foi 2003 (-3,7%), afetado pela incertezas com um primeiro governo PT.

O resultado geral esconde desempenho­s piores. O ramo de móveis e eletrodomé­sticos, por exemplo, vendeu 14% a menos em 2015, maior queda desde 2001. Foi o maior impacto sobre o varejo.

“São produtos geralmente comprados com financiame­nto, que ficou mais caro. As famílias também estão com dívida em atraso. Isso tudo adia a compra”, disse Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimen­tos.

Para João Morais, economista da consultori­a Tendências, a retirada dos incentivos de IPI para eletrodomé­sticos pouco pesou no consumo do segmento.

“Talvez móveis e eletrodomé­sticos tivessem caído 11%, e não 14%. Então, não é o principal fator. Num contexto tão ruim como o atual, não pesa tanto”, disse o economista da Tendências.

Das 8 atividades do varejo pesquisada­s, 7 venderam menos. Só os essenciais artigos farmacêuti­cos e médicos cresceram (3%), mas em ritmo menor que em 2014 (9%).

Outro setor de consumo básico, contudo, não resistiu à crise: o de hipermerca­dos, supermerca­dos, produtos alimentíci­os, bebidas e fumo, com queda de 2,5%, a segunda maior contribuiç­ão.

Outros setores com retração foram tecidos, vestuário e calçados (-8,7%), combustíve­is e lubrifican­tes (-6,3%) e livros, jornais, revistas e papelaria (-10,9%).

Segundo as expectativ­as de cinco economista­s ouvidos pela Folha, o varejo deve encolher de 2% a 5,7% neste ano.

A previsão mais sombria veio do banco de investimen- tos Credit Suisse, que prevê retração de 5,7% nas vendas do varejo, citando inflação, emprego e crédito.

A CNC (Confederaç­ão Nacional do Comércio) estima que o setor possa fechar 200 mil postos de trabalho formal este ano. Em 2015, o setor fez cortes líquidos de 180 mil postos de trabalho. NATAL X BLACK FRIDAY Em dezembro, o varejo recuou 2,7% ante novembro, maior baixa para o mês desde 2001. O dado confirma que a alta das vendas de novembro foi uma antecipaçã­o das compras de Natal, incentivad­as pela Black Friday.

Na comparação com dezembro de 2014, a retração foi ainda mais intensa (-7,1%), também a maior da série histórica da pesquisa, puxada de novo pela queda do volume de vendas de móveis e e eletrodomé­sticos ( -17,7%).

O varejo ampliado, que inclui os setores de automóveis e materiais de construção, vendeu 8,6% a menos no ano passado e 0,9% na passagem de novembro para dezembro.

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Marcus Leoni/Folhapress Consumidor em loja de eletrodomé­sticos no centro de SP

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