Folha de S.Paulo

Queda no PIB será mais grave para setor interno do que índice oficial

Consumo e investimen­tos, que dependem do mercado interno e do emprego, serão mais afetados neste ano

- MARIANA CARNEIRO DE SÃO PAULO

Para além do encolhimen­to de mais de 7% no PIB do Brasil, previsto por especialis­tas para 2015 e 2016, os efeitos na economia podem ser ainda mais graves no consumo das famílias e do governo e nos investimen­tos.

O Itaú Unibanco prevê queda de 4% no PIB em 2016, com “sensação térmica” de 5,6%. “Quem está olhando para o mercado doméstico verá uma queda maior do que a do PIB”, diz o economista-chefe, Ilan Goldfajn.

Mesmo no auge da crise dos EUA, em 2009, o PIB brasileiro encolheu 0,1%, mas o consumo e os investimen­tos, somados, cresceram quase 3%, amparados no então bom desempenho do mercado de trabalho.

Cálculos do Itaú Unibanco mostram ‘sensação térmica’ pior que a recessão pela 1ª vez desde 2003

Economista­s preveem que o PIB do Brasil vá encolher mais de 7% em 2015 e 2016. Pode ser pior? Pode. A “sensação térmica” desse congelamen­to do país é ainda mais grave para o público doméstico, que assiste ao desmoronam­ento do consumo e do investimen­to.

Noutras palavras, se o PIB cai, a queda é ainda mais acentuada nos segmentos que dependem do mercado interno e do emprego: o consumo das famílias e do governo e os investimen­tos.

Nas contas do Itaú Unibanco, o PIB, ou a temperatur­a oficial medida pelo IBGE, deve cair 4% neste ano. A sensação térmica será pior: queda de 5,6%, prevê o economista-chefe do banco, Ilan Goldfajn.

“Quem está olhando para o mercado doméstico verá uma queda maior do que a do PIB”, diz.

Desde 2003 não se via nada parecido. Até então —e mesmo no auge da crise dos EUA, em 2009—, o PIB podia até sofrer, mas a demanda doméstica seguia robusta.

Em 2009, enquanto o PIB encolheu 0,1%, o consumo e os investimen­tos internos, somados, cresceram quase 3%.

“Muitos chamaram de ‘marolinha’ a crise de 2009, e, para muita gente, foi isso mesmo”, diz a economista Silvia Matos, do Ibre (Instituto Brasileiro de Economia), da FGV.

Ela se refere à expressão criada pelo ex-presidente Lula para falar da crise econô- mica de então.

Isso só foi possível devido ao aumento do consumo ao longo da década, amparado na ampliação do crédito e no bom desempenho do mercado de trabalho.

Desde o ano passado, porém, o desemprego voltou a aumentar, situação que deve piorar neste ano.

Segundo Silvia, a taxa de desemprego medido pela Pnad Contínua deve ter fechado 2015 ao redor de 9%. Subirá para 12% neste ano, segundo suas previsões.

“Tudo conspira para a queda do consumo das famílias.”

Silvia estima que 2016 deverá ser o pior ano para o emprego na atual crise econômica, que nos cálculos de Goldfajn deve bater no fundo do poço no primeiro trimestre deste ano. O Itaú, no entan- to, prevê piora adicional do desemprego em 2017.

“Não temos certeza de que a economia vá parar de cair, mas esperamos uma relativa estabilida­de a partir do segundo semestre”, diz Silvia.

A queda nas vendas do varejo no ano passado, divulgada nesta terça (16) pelo IBGE, comprova que o consumo de fato se deprimiu. Já no setor de serviços, diz Silvia, a queda começou a ser sentida em meados de 2015.

“As pessoas começaram a apertar as compras de bens duráveis [como geladeira, carro] em 2014, a última etapa do corte foram os serviços. Não é fácil mudar a escola do filho, por exemplo”, diz.

O pior sinal, para a economista, é que esse recuo do consumo seja acompanhad­o de uma queda também acentuada dos investimen­tos, o que reduz a capacidade de crescer do Brasil no futuro.

“O ajuste do consumo é dolorido, mas é como regime, fecha-se a boca por um tempo. O problema são os investimen­tos, que reduzem o potencial da economia. Eé o terceiro ano seguido de queda.”

SETOR EXTERNO

Goldfajn observa que a única contribuiç­ão positiva que ele enxerga para o PIB, tanto em 2015 quanto neste ano, vem do setor externo.

Apesar do baixo cresciment­o lá fora e do pânico nos mercados globais, algumas empresas ganharam confiança para voltar ao mercado externo com a alta do dólar.

A recessão doméstica também abateu as importaçõe­s, e a expectativ­a é que o deficit do país no exterior chegue a zero ao fim do ano que vem.

O respiro, mesmo que com componente negativo da recessão, pode ajudar o Banco Central a reduzir a taxa de juros e estimular a economia.

Muitos chamaram de ‘marolinha’ a crise de 2009, e, para muita gente, foi isso mesmo SILVIA MATOS economista do Instituto Brasileiro de Economia, sobre o fato de que, em 2009, o PIB encolheu 0,1%, mas consumo e investimen­tos internos, somados, cresceram quase 3% Quem está olhando para o mercado doméstico verá uma queda maior do que a do PIB ILAN GOLDFAJN economista-chefe do Itaú Unibanco

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Zanone Fraissat - 4.fev.2016/Folhapress Centro de apoio a desemprega­dos no centro de São Paulo

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