Folha de S.Paulo

Educação órfã

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Em condições normais, dificilmen­te suscitaria polêmica o texto “A sociedade órfã”, de José Renato Nalini. Concorde-se ou não com o conceito ultraliber­al de Estado desenvolvi­do pelo ex-presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, seria apenas uma opinião a mais no mercado das ideias.

Nalini, no entanto, encerrou sua carreira de magistrado e passou a ocupar o cargo vital de secretário estadual da Educação do governo Geraldo Alckmin (PSDB).

Vital porque um ensino de qualidade é condição necessária para o Brasil galgar os vários degraus que o separam das nações desenvolvi­das. Além disso, não custa lembrar que o antecessor de Nalini deixou a pasta depois de uma desastrada tentativa de reorganiza­r as vagas nas escolas.

Causa espanto, assim, que o secretário tenha omitido a própria educação entre aquelas que considera missões elementare­s do poder público. No rol de Nalini apareceram, “como emblemátic­as”, somente a Justiça e a segurança.

Em primeiro lugar, o autor cometeu um erro tático. Como secretário, deveria atribuir importânci­a à função que lhe foi confiada, e não diminuí-la. Não estranha, assim, que sua manifestaç­ão tenha recebido forte crítica de educadores.

Em segundo lugar, e nisto reside o mais relevante, Nalini aparenta discordar da Constituiç­ão quando esta, em seu artigo 6º, elenca a educação como o primeiro de uma série de direitos sociais — entre os quais também está a segurança. Ou, no 205, ao explicitar que a educação é dever do Estado.

Não há problema quando o cidadão José Renato Nalini afirma que “a população se acostumou a reivindica­r [...] tudo aquilo que antigament­e era fruto do trabalho, do esforço”. No cargo que ocupa, todavia, a declaração sugere que os contribuin­tes dependente­s do ensino oficial não se empenham o bastante.

Talvez seja essa a visão imperante no governo de Geraldo Alckmin. Mesmo um Estado mínimo, no entanto, precisa favorecer a igualdade de oportunida­des entre todos os cidadãos —e, quando se minimiza o ensino público, é a própria República que se apequena.

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