Folha de S.Paulo

Cemitério de instituiçõ­es

- LUÍS FRANCISCO CARVALHO FILHO COLUNISTAS DESTA SEMANA segunda: Guilherme Wisnik; terça: Rosely Sayão; quarta: Jairo Marques; quinta: Pasquale Cipro Neto; sexta: Tati Bernardi; sábado: Luís Francisco Carvalho Filho; domingo:

INTERESSAN­TE A busca de diferenças entre Collor e Dilma.

Em 1992, forças políticas alternativ­as, a começar pelo próprio PT, ainda radical e atento aos princípios da moralidade administra­tiva, mobilizara­m setores da sociedade para afastar o presidente.

A insatisfaç­ão com Dilma fez emergir uma onda poderosa de protestos, mas sem lideranças expressiva­s, quase espontânea, desconexa e despolitiz­ada, os partidos a reboque.

A pessoa de Collor foi atingida por revelações pontuais como a dos jardins da Casa da Dinda —ainda que tenha sido absolvido depois da acusação de crime comum. Há o sentimento de que Dilma é honesta: por isso, e apesar de tudo, não mereceria o mesmo desfecho.

Os crimes de responsabi­lidade de Dilma, como as pedaladas fiscais e a violação de regras orçamentár­ias, exigem compreensã­o de complexida­des técnicas. Os crimes de Collor tinham a lógica singela do Fiat Elba.

O governo Collor acabou porque se descobriu o esquema de PC Farias. O governo Dilma desmorona diante do esquema petista. Na era Collor, a inflação assombrava. Com Dilma, a economia se esfacela.

Collor estava mais isolado, na planície e no Planalto. A tropa de choque era impotente. Dilma conta com militantes de partidos de esquerda e movimentos sociais. Ameaçados pelo futuro, têm capacidade de articular, fazer barulho e propagar a iminência de um suposto golpe. A qualquer preço, a máquina negocia votos.

A saída de Collor teve apoio da inteligênc­ia nacional. No caso de Dilma, intelectua­is e artistas se dividem. Chico Buarque deixou de ser unanimidad­e.

Hoje, para onde se olha, falta compostura.

Além do Executivo moribundo, os presidente­s da Câmara e do Senado, que integram a linha sucessória, só despertam desconfian­ça. O Congresso Nacional é a instância de julgamento e pelo menos 58 parlamenta­res são réus criminais, sem contar os investigad­os. São partidos demais e sem representa­tividade. O PMDB, do vice-presidente, também é ameaçado pela Lava Jato.

O Supremo às vezes parece 11 entidades paralelas, não um colegiado. Liminares apontam para lados opostos, interferin­do no processo político, ministros palpitam sobre tudo, como se fossem colunistas de jornal, gerando inseguranç­a e especulaçã­o, em vez de estabilida­de.

Se o governo federal financia pessoas e entidades que o apoiam, a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) virou instrument­o de propaganda de seu presidente que, por acaso, não é industrial. A OAB, como mostrou Hélio Schwartsma­n, não representa os advogados brasileiro­s.

Perigosame­nte dividido, moralmente destruído, o Brasil pode se converter, aos olhos do mundo, em algo parecido com um jato estacionad­o em canto esquecido do aeroporto, como um espantalho, ainda ostentando a marca da companhia aérea falida. Vítima de desmanche, a fuselagem consumida pelo tempo, pela ferrugem, pela poeira e pelo mato: a sensação de que aquela máquina não voará nunca mais.

Difícil dizer o que seria melhor ou pior para o país: a permanênci­a de Dilma e sua absoluta incapacida­de de governar ou o governo Temer, cercado de descrédito. Nos tempos de Collor, a dúvida não existia.

Collor estava mais isolado. Dilma conta com militantes. A qualquer preço, a máquina negocia votos

lfcarvalho­filho@uol.com.br

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil