Folha de S.Paulo

Se o governo Michel Temer for um sucesso, o PMDB pode substituir o PSDB à frente da centro-direita.

- CELSO ROCHA DE BARROS

CADA UM tem sua lista de coisas difíceis de perdoar na história do PSDB. Mas,aomenosnam­inha,nãoentram as dúvidas atuais dos tucanos sobre entrar ou não no governo Temer.

Se Temer for um sucesso, o PMDB pode substituir o PSDB na liderança da centro-direita brasileira. Não há nada que obrigue DEM, PPS e Solidaried­ade, ou os amplos setores da elite econômica fiéis até agora aos tucanos, a apoiarem um partido liderado por um sociólogo da USP. O PSDB cresceu quando venceu, e quem vencer em seu lugar passará a ter grandes chances de substituí-lo.

Por outro lado, se Temer for um fracasso, arrastará consigo quem tiver apoiado o impeachmen­t. E o PSDB sabe o quão difícil é ser governo no Brasil atual. Perguntem a Dilma Rousseff. Nenhum governo no Brasil atual estaria 100% a salvo da Lava Jato, e, se você tivesse que listar os governos possíveis do mais pa- ra o menos seguro, dificilmen­te começaria pelo do PMDB. E o PSDB sabe melhor do que ninguém a diferença que fez para o governo Itamar ter um Plano Real, o que Temer não tem. Se o governo Itamar tivesse sido inteiro tão ruim quanto foi até FHC assumir a Fazenda, Lula teria sido eleito em 1994 no primeiro turno.

Na verdade, o impasse atual é parte de uma crise de liderança da direita brasileira que começou depois da eleição de 2014. Ela foi ofuscada pela crise do PT, mas é ao menos tão importante quanto ela para explicar o que está acontecend­o.

Após a quarta derrota presidenci­al seguida, o PSDB não conseguiu mais controlar os partidos e grupos sociais que liderou desde 1994. Todos eles aderiram ao impeachmen­t mais rápido que os tucanos, que provavelme­nte preferiam deixar Dilma sangrar até 2018.

Para DEM, PPS ou Solidaried­ade, tanto fazia ser coadjuvant­e de Aécio ou de Temer, e Temer viria mais cedo. Vale lembrar que os tucanos foram vaiados na passeata da Paulista, mas Caiado não foi. A mobili- zação das ruas fortaleceu quem, como o DEM, tinha um discurso direitista com mais chance de inflamar a militância pró-impeachmen­t.

A luta pelo impeachmen­t também favoreceu quem era mais próximo do Centrão, fundamenta­l para derrubar Dilma no Congresso. Era o caso do Solidaried­ade, cujo líder elogia tanto Eduardo Cunha que até o pobre Eduardo deve achar meio demais.

Os coadjuvant­es DEM, Solidaried­ade e PPS conseguira­m seu impeachmen­t, e devem conseguir seus cargos. Mas, depois de terem se revoltado contra seus líderes tucanos, os direitista­sdaSérieBa­gorapedemq­ue o PSDB lhes forneça novamente os quadros e a respeitabi­lidade pública que forneceu por 20 anos. O PSDB reuniu esses quadros porque era um partido com perspectiv­a de liderar governos. Não podia se envolver com Cunha, como o Solidaried­ade, ou radicaliza­rodiscurso,comoo DEM,porque jogava o jogo majoritári­o.

Na hora de governar, chamam de novo o partido de quadros. Mas agora os antigos coadjuvant­es não aceitam ceder a cabeça de chapa, como o PFL aceitou em 1994. Agora o PSDB teria que disputar cargos com Paulinho da Força em um governo Temer. Perdoem a turma de FHC por sua falta de entusiasmo.

Enfim, a única certeza é que em alguns meses os novos governante­s compreende­rão porque o PSDB teve dúvidas sobre a conveniênc­ia de virar governo em uma hora dessas. Quem não teve dúvidas foi quem não estava acostumado a se pensar como presidente.

O impasse atual é parte de uma crise de liderança da direita que começou após a eleição de 2014

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