Folha de S.Paulo

Merenda fora da vista

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A julgar pelas declaraçõe­s públicas do governador Geraldo Alckmin (PSDB), o escândalo da máfia da merenda no Estado de São Paulo merece apuração rigorosa, célere e independen­te. Imagina-se que o tucano se refira não só às investigaç­ões judiciais mas também às frentes administra­tivas e políticas.

Nesse caso, ou bem os integrante­s da Assembleia Legislativ­a (Alesp) dão de ombros para o governador, ou sabem que ele se esforçará pouco para ver suas palavras transforma­das em realidade. É que a base de apoio de Alckmin tem feito o que pode para impedir que os deputados estaduais reforcem o combate à corrupção.

A Polícia Civil e o Ministério Público estadual até cumprem seu papel. Embora não com a mesma presteza dos órgãos federais que comandam a Operação Lava Jato, esquadrinh­am contratos celebrados entre a Cooperativ­a Orgânica Agrícola Familiar (Coaf ) e dezenas de prefeitura­s, além da Secretaria da Educação do Estado.

Suspeita-se de um esquema de superfatur­amento na distribuiç­ão de suco de laranja para a merenda da rede pública, garantido por propinas que oscilavam de 10% a 30% dos valores acertados.

Por meio de delações premiadas, alguns investigad­os implicaram membros do governo Alckmin, além de deputados federais e estaduais —entre eles, Fernando Capez (PSDB), presidente da Alesp.

Apesar disso —ou por causa disso—, a Assembleia Legislativ­a não demonstrou interesse em criar uma CPI. Como alternativ­a, a oposição, liderada pelo PT, tenta convocar suspeitos para prestar esclarecim­entos em outras comissões. Apresentar­am-se 15 requerimen­tos, mas nenhum foi apreciado.

A fim de evitar a análise das petições, os trabalhos têm sido esvaziados. Na Comissão de Educação, por exemplo, não houve quorum em quatro das seis sessões do ano. Nas outras duas, deputados do PSDB se revezaram nos pedidos de vista, evitando convocaçõe­s.

Não se trata de atitude nova no âmbito parlamenta­r. Mas, se o “governo é vítima” da máfia da merenda, conforme declarou Geraldo Alckmin na semana passada, seu partido deveria ser o maior interessad­o em esclarecer o episódio.

Ao se valerem de manobras regimentai­s para adiar as investigaç­ões, os tucanos sugerem que as declaraçõe­s do governador não passam de jogo de cena.

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