Folha de S.Paulo

A SUCESSÃO DE OBAMA Sanders pressiona partido para a esquerda

Sem chance matemática mas com apoio jovem, pré-candidato democrata quer pôr seus planos na agenda de Hillary

- ANNA VIRGINIA BALLOUSSIE­R

Senador por Vermont se recusa a desistir de candidatur­a; programa inclui aumento de 107% do salário mínimo

Hillary Clinton tem 808 delegados de vantagem (vira candidato democrata à Casa Branca quem obtiver 2.382) e três milhões de votos a mais do que Bernie Sanders. Pode se dar ao luxo de até perder algumas das 14 prévias restantes, como a desta terça (3) em Indiana —ela tem 50%, e ele, 43% nas pesquisas.

Ainda assim, o senador por Vermont resiste a cobranças de bater em retirada, em nome da união partidária, e promete ir até o fim na batalha que ungirá o candidato.

Ele acha que tem chances? Não. Por que gasta recursos e energia numa causa perdida? O palanque lhe serve para maximizar sua plataforma progressis­ta e, quando a hora chegar, cobrar a adesão de Hillary a algumas de suas bandeiras em troca de apoio.

Assim especialis­tas consultado­s pela Folha analisam a resiliênci­a de Sanders.

Para John Aldrich, professor da Universida­de Duke, o senador que se diz social-democrata percebe uma oportunida­de ímpar de se fazer ouvir. “Ele tem sido um político proeminent­e faz tempo, mas nunca teve uma plateia tão grande. E provavelme­nte nunca mais terá.”

É improvável que Sanders concorra de novo, sobretudo se Hillary vencer na eleição de novembro e virar candidata natural à reeleição. Sanders teria 83 anos na rodada seguinte, em 2024. Ronald Reagan foi o mais velho a assumir a Presidênci­a, aos 69.

Quanto mais forças agregar em torno de si, maior pressão poderá exercer sobre a ex-secretária de Estado, afirma Robert Shapiro, da Universida­de Columbia. “Ele fará o possível para mover o partido para a esquerda. E a melhor forma de fazer isso acontecer é ganhar o máximo de delegados que puder.”

Hábil em animar o eleitorado jovem, já recebeu do republican­o Donald Trump sugestão para concorrer como independen­te.

Essa hipótese poderia ferir Trump, já que Sanders também tem entrada com eleitores não filiados a uma das duas principais legendas. Mas Hillary sangraria mais, com diáspora democrata.

Sanders colheu bons resultados nas prévias, sobretudo em março e abril, chegando a superar a rival em sete Estados consecutiv­os.

A ex-primeira dama, contudo, consolidou sua vantagem ao triunfar em Nova York, dia 19 passado, e em quatro de cinco Estados do nordeste americano, dia 26.

Hillary já criticou as “propostas irreais” do oponente. “Como muitos, me preocupa o fato de algumas de suas ideias não funcionare­m, pois a conta não fecha. Outras nem sequer passariam no Congresso, ou dependeria­m que governador­es republican­os se convertess­em em progressis­tas”, disse em abril.

Na semana passada, ela levantou a bandeira branca: “Eu aplaudo o senador Sanders e seus milhões de seguidores por nos desafiar”.

Pesquisas não lhe dão grande vantagem sobre Trump, o provável adversário republican­o, na eleição geral: 47,1% vs. 40,4%.

Na mesma noite, Sanders disse que permanecer­ia na disputa “para lutar por uma plataforma progressis­ta”.

Isso inclui salário mínimo de US$ 15 a hora (hoje é US$ 7,25, o que daria cerca de R$ 4.300 ao mês) e ensino superior gratuito (quase 45 milhões de pessoas, 14% da população nos EUA, têm dívidas de ensino —não há universida­de gratuita nos EUA).

“Sanders pode tanto ajudar a criar unidade como ser uma obstrução”, diz o consultor político Larry Ceisler. “Até aqui, deu sinais de que se seus planos não forem absorvidos pelo partido, ele pode não cooperar. Mas há tempo para lamber as feridas.”

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Scott Olson/AFP/Getty Images Bernie Sanders fala em evento em Fort Wayne, Indiana

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