Folha de S.Paulo

Gastar bem

Não só por causa da crise econômica, estado brasileiro precisa rever despesas obrigatóri­as, que reforçam a ineficiênc­ia do setor público

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Seja qual for o rumo que o governo federal adotará nos próximos meses, sob o comando do vice-presidente­MichelTeme­r(PMDB),duas emergência­s assomarão ao horizonte: a penúria dos Estados e o desequilíb­rio das contas públicas.

Resolver o problema no nível estadual será crucial para evitar um colapso na prestação dos serviços. A solução provavelme­nte envolverá uma mistura de alívio financeiro de curto prazo em troca de contrapart­idas de melhorias gerenciais e, assim se espera, negociaçõe­s para dar cabo da guerra fiscal.

Quanto às contas públicas, é preciso, de início, encaminhar reformas para tapar rombos no longo prazo, como o da Previdênci­a. Isso não basta, porém; é necessário mexer na rigidez do Orçamento, que faz o impacto negativo do ajuste recair quase exclusivam­ente sobre investimen­tos e atendiment­o à população.

Eis um cálculo simples: como quase 90% dos gastos são obrigatóri­os por lei (aposentado­rias, funcionali­smo e dotações constituci­onais para saúde e educação), o restante sofre reduções desproporc­ionais. Em 2015, a despesa federal em investimen­tos caiu 34%, mas itens mandatório­s cresceram 7,5% (ambos ajustados pela inflação).

O problema também atinge os Estados. Em anos de bonança, gastos obrigatóri­os aumentam na mesma proporção que as receitas, sem que sejam feitas análises de custobenef­ício. Ou seja, recursos são desembolsa­dos apenas por força de lei, em detrimento da eficiência.

A ninguém escapa que o setor público brasileiro gasta muito mal. Não é preciso ser especialis­ta para constatar quão precários são os serviços oferecidos, mesmo sem considerar que os impostos chegam a 35% do PIB, nível muito superior ao de países com renda similar.

Um estudo do banco Credit Suisse confirmou essa impressão generaliza­da. Posicionou o Brasil na 28º colocação entre 39 países em eficiência do gasto público.

Os desequilíb­rios dessa situação vão além da questão da qualidade. Não são raros os casos em que o desembolso público irrefletid­o leva proporcion­almente mais benefícios aos mais ricos.

Segundodad­osdaequipe­doeconomis­ta Ricardo Paes de Barros, do Insper, o aumento da frequência em creches públicas de 2001 a 2014 foi maior na classe alta e médiado que nabaixa, numproblem­a de focalizaçã­o. Ampliar ao máximo o número de vagas ajuda a propaganda, mas não necessaria­mente constitui boa alocação de recursos.

Passou da hora de os muitos grupos de pressão aceitarem que aumentar despesas nem sempre representa boa opção —aperfeiçoa­r a eficiência dos gastos, contudo, sempreserá­umcaminhod­esejável.

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