Facebook vê ameaça para negócio no futuro
DE SÃO PAULO
O WhatsApp voltou ao ar na tarde desta terça-feira (3) no Brasil, após 25 horas fora do ar. Um desembargador do Tribunal Regional de Sergipe determinou o fim do bloqueio ao aplicativo em razão, entre outros argumentos, do “caos social” gerado no país pela falta da ferramenta.
“A suspensão dos serviços do WhatsApp já dura 24 horas e certo é também que gerou caos social em todo o território, com dificuldade de desenvolvimento de atividades laborativas, lazer, família etc.”, escreveu Ricardo Múcio Santana de Abreu Lima em sua decisão.
No texto, Lima tende mais à argumentação do WhatsApp, que diz não conseguir, tecnicamente, fornecer os dados pedidos pelo juiz Marcel Montalvão, da comarca de Lagarto (Sergipe).
Como o app não divulgou informações sobre conversas entre supostos membros de uma quadrilha de tráfico de drogas da cidade, Montalvão determinou o bloqueio da ferramenta por 72 horas. A atuação do juiz no caso agora será investigada pela Corregedoria Nacional de Justiça.
“O fato é que não há condições de afirmar, pelo menos por enquanto, que as informações poderiam ser fornecidas pelo WhatsApp ou
RICARDO MÚCIO LIMA
desembargador que liberou o app que estas podem ser desencriptadas”, diz Lima.
A decisão de Lima também traz à tona também alguns detalhes sobre o caso que ainda não estavam muito claros, porque o processo corre em segredo de Justiça.
Não se tinha certeza, por exemplo, sobre os pedidos exatos de Montalvão. Ele quer acesso “irrestrito” a conversas de texto, fotos, vídeos, conversas de voz e agenda de contatos de 36 usuários do WhatsApp. Fundamenta-se em artigos do Marco Civil da Internet que determinam que os prestadores de serviços guardem dados sobre os usuários e os encaminhem à Justiça em caso de crimes.
Para o advogado Francisco Carvalho de Brito Cruz, do centro de pesquisas InternetLab, a legislação determina que as empresas guardem os dados de acesso, e não o conteúdo publicado por usuários.
Na decisão, Lima sugere que o Supremo Tribunal Federal arbitre sobre o tema, normatizando os serviços das redes sociais no país. Para isso, o STF teria de ser provocado.
Nesta terça, antes da liberação do WhatsApp, o deputado Raul Jungmann (PPSPE) entrou com uma ação no tribunal em nome do partido pedindo a volta do aplicativo —a suspensão, segundo ele, viola o direito constitucional de comunicação. BATE-REBATE Durante a madrugada desta terça (3), o WhatsApp foi duramente criticado por um outro desembargador, plantonista, que negou um primeiro recurso da empresa.
Cezário Siqueira Neto disse que o aplicativo “minimiza a importância da investigação criminal”, “escamoteando a gravidade do delito supostamente praticado, sob a pecha de garantir o direito à intimidade dos usuários”. Ele chegou a indicar uma lista de apps alternativos.
“A ideia de que todos os brasileiros possam ter seu direito à liberdade de comunicação negado dessa forma é muito assustadora em uma democracia”, escreveu em um post Mark Zuckerberg, o presidente-executivo do Facebook, que comprou o aplicativo em 2014.
Representantes do Facebook, dono do WhatsApp, desembarcaram em peso em Brasília na segunda (2) para convencer deputados no Congresso a barrar um projeto que quer permitir o bloqueio de aplicativos que descumpram decisões judiciais.
O projeto de lei será apresentado caso o relatório final da CPI dos Crimes Cibernéticos seja aprovado sem mudanças. Depois de muita pressão, a votação foi suspensa nesta terça-feira (3).
Adquirido pelo Facebook, em fevereiro de 2014, o WhatsApp não dá lucro e tampouco atrai publicidade. Suspensões temporárias hoje não chegam a ameaçar o negócio.
Contudo, existe uma preocupação de que o “ambiente hostil” criado pela Justiça e pela CPI comprometam o negócio no longo prazo.
Quando decidiu desembolsar em 2014 cerca de US$ 22 bilhões pelo WhatsApp, Mark Zuckerger, dono do Facebook, afirmou que priorizaria o “crescimento, em vez da monetização” do serviço.
O objetivo era transformálo em uma ferramenta de “primeira necessidade”, a maior plataforma de comunicação global do mundo. Desde a aquisição, o serviço mais que dobrou em usuários e hoje conta com quase 1 bilhão.
A Folha apurou que os próximos passos preveem a integração do WhatsApp com canais de comunicação de empresas, como bancos e seguradoras, e o ingresso na publicidade —o que faria a receita explodir gerando lucro.
Para a empresa, o poten- cial é enorme. Mais de 70% dos usuários ficam conectados diariamente. Seria uma vitrine em tempo integral.
Hoje, o WhatsApp já garantiu a sensação de “necessidade”. O deputado Raul Jungmann (PPS-PE), por exemplo, foi ao Supremo Tribunal Federal pedir o desbloqueio por considerar violação ao “direito da livre comunicação”.
Na CPI, muitos deputados também passaram a defender o WhatsApp. “Estão banalizando o bloqueio de aplicativos”, disse o deputado João Arruda (PMDB-PR).
Já Esperidião Amin (PPSC), relator da CPI, considera que o Marco Civil da Internet permite o bloqueio. “Não somos nós que estamos permitindo o bloqueio”, disse. MACHADO DA COSTA, Alguém deve ter tido acesso ao celular do usuário em questão: ele pode ter sido apreendido em uma operação policial e ter uma senha de desbloqueio de tela fácil; ou alguém com acesso à conversa a divulgou
O que diz o Marco Civil da Internet?
A legislação prevê a suspensão do serviço quando o aplicativo descuide do sigilo de dados de seus usuários, mas magistrados têm entendido o texto de forma mais ampla e pedido o bloqueio quando o aplicativo mostra não guardar esses dados ou não quer repassálos a investigações
“
A Justiça, ao decretar a interrupção do WhatsApp, o está fazendo como punição para garantir o bem comum. Este mesmo bem comum deve ser resguardado com o desembaraço da web
Por que a Justiça não determina uma multa?
Inicialmente o juiz determinou multa, de R$ 50 mil, caso o app não liberasse os dados; como a empresa não liberou as informações, determinou a prisão do vicepresidente do Facebook e agora o bloqueio ao app