Folha de S.Paulo

MILLÔR FERNANDES

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“O espelho é o também de você nunca.” Um homem careca, de óculos escuros, chega a essa conclusão um tanto enigmática ao ver seu próprio reflexo num desenho de Millôr Fernandes. Não parece ser um autorretra­to, mas o cartunista poderia ser esse cara perdido, às vezes desesperan­çado, talvez mais à procura de perguntas que de respostas.

Também foi um dos maiores cronistas visuais dos costumes e da vida política do país, alvo de seus desenhos e charges ao longo de quase sete décadas —desde seus primeiros traços na coluna “PifPaf” da extinta “O Cruzeiro”, que estreou em 1945, até sua morte, aos 88, há quatro anos.

Mas, mesmo que olhasse para os descaminho­s do Brasil, seu filtro era ele mesmo. Nos 500 desenhos do artista agora juntos no Instituto Moreira Salles carioca, na maior mostra já dedicada a ele, Millôr aparece multiplica­do em autorretra­tos e nas infinitas versões de suas assinatura­s.

Elas, aliás, não deixam de ser um adorno, já que seus comentário­s ácidos, nunca distantes da poesia, são inconfundí­veis. No casarão da Gávea, cada sala revela um lado de sua obra vertiginos­a, começando pelo mais ególatra —ali ele surge gigante, saindo da praia como mais uma montanha em frente ao Pão de Açúcar, e a palavra “eu” aparece escrita no miolo de um redemoinho de setas.

No resto de seus desenhos, todas elas parecem apontar para a realidade vista por ele. Seu tempo no “Cruzeiro”, talvez onde mais experiment­ou técnicas e soluções gráficas, mostra a enorme gama de assuntos que atraíram seu olhar, além de um embrião de sua verve para atacar a miséria de cada dia brasileiro.

Uma das colunas “PifPaf”, por exemplo, falava em como “os americanos escreveram um livro famoso intitulado ‘Coma e Emagreça’” e “os brasileiro­s estão esperan- do alguém que escreva um lida mostra, o que resultou vro ‘Passe Fome e Engorde’”. na demissão do cartunista.

De fato, a pobreza material Millôr então levou a “Pife de espírito parece ser um dos Paf”comele, editandoum­aremaiores alicerces do humor vista com o nome da coluna, construído pelo artista, emboe passou a publicar na “Veja”, ra não anulasse momentos de uma de suas maiores vitrines. genialidad­e mais singela. Na Essa mudança de enderemesm­a revista, um homenziço coincidiu com o golpe de nho faz um buquê de flores re1964. A ditadura e seus genecortan­do parte da estampa rais retratados como pavões gráfica da página onde foi impor Millôr viraram uma espépresso para dar à sua amada. cie de obsessão nos desenhos.

Mas a lua de mel de Millôr Enquanto ironizava os micom “O Cruzeiro” terminou litares, a sociedade mesquicom a publicação de “Esta É, nha e racista também não Realmente, a Verdadeira Hissaía do radar. Num desenho tória do Paraíso”. A série de da época, um guarda ao ladesenhos de 1963, que zombado de uma placa que diz “é va da narrativa bíblica da criaproibi­do comer a grama” vição do mundo, causou uma gia um j ardim por onde “grita entre as senhoras catópassa uma família de negros. licas”, lembra Paulo Roberto Seu desencanto também Pires, um dos organizado­res tange os dramas menos sérios de uma classe média desiludida, de casais inebriados diante da televisão, suicidas resignados se equilibran­do no parapeito dos prédios e velhinhos solitários em bancos de praça vendo as horas passar.

Nos raros momentos em que toma distância da realidade mais imediata, Millôr mergulha na história da arte, parodiando clássicos, como o “Guernica”, de Picasso, e os quadrados coloridos de Mondrian, que viram cruzes nas mãos de padres em procissão. QUANDO de ter. a dom., das 11h às 20h; até 21/8 ONDE Instituto Moreira Salles, r. Marquês de São Vicente, 476, Rio, tel. (21) 3284-7400 QUANTO grátis

No banco A Band ainda tem alguns dias para decidir o que colocará na grade nas noites de quarta no lugar dos jogos do Brasileiro. Em maio, já estava programada a exibição de filmes nesse horário, por causa da Copa do Brasil.

Família O cantor Xororó e o filho, Junior, cantarão juntos no “Altas Horas” (Globo) deste sábado (7).

Prata O SBT se manteve em 2º lugar no ranking de audiência total do dia no Painel Nacional de TV do Ibope, em abril, com 5,3 pontos de média. A Record teve 5 pontos, e a Globo 13,2 (cada ponto equivale a 684,2 mil espectador­es).

Bronze A GloboNews foi o 3º canal mais visto da TV paga em abril, atrás de dois infantis.

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