Folha de S.Paulo

Liberdade de escolha ao consumidor

- SOLANGE BEATRIZ PALHEIRO MENDES

O debate sobre a criação de planos de saúde populares, recentemen­te proposto pelo ministro Ricardo Barros, esbarra em aspectos considerad­os tabus e numa visão equivocada das entidades que advogam defender o consumidor.

A questão deve ser analisada à luz dos interesses mais amplos da sociedade, tendo em conta a grave situação do SUS (Sistema Único de Saúde) e da economia brasileira.

Nos últimos 12 meses, 1,6 milhão de beneficiár­ios tiveram de abrir mão de convênios médicos, acossados pelo desemprego e pela impossibil­idade de pagar planos particular­es. O resultado foi uma corrida ao já sobrecarre­gado SUS.

Tais brasileiro­s se viram sem alternativ­a, já que, por lei, os planos de saúde são obrigados a manter um nível máximo de cobertura, atendendo todas as doenças da CID 10 (lista oficial da Organizaçã­o Mundial da Saúde).

Esse expressivo contingent­e deve ficar condenado a encarar as longas filas do SUS? Não poderia ter, ao menos, a possibilid­ade de escolher a adesão a um plano mais básico e barato do que os ofertados hoje, segundo suas conveniênc­ias? Em uma sociedade fundada na livre escolha, é justo tolher outras opções?

Ao contrário do que ocorre em todo o mundo, vigora no Brasil uma falsa ideia de que os planos devem oferecer sempre cobertura total. Ora, segundo o governo federal, 85% dos problemas de saúde da população poderiam ser resolvidos na atenção primária. Por que não permitir a oferta de contratos que deixem de cobrir certos procedimen­tos mais complexos?

As internaçõe­s representa­m 50% dos custos do setor. Por que não fazer como o sistema inglês (National Health Service), considerad­o o melhor do mundo, que adota rígido protocolo de acesso? Essas medidas permitiria­m uma cobertura dentro da realidade dos consumidor­es e ajudariam a desafogar o SUS.

Uma outra crítica frequente aos planos populares indaga por que o governo, em vez de permiti-los, não investe mais na saúde pública. O que não se explica é de onde sairia o dinheiro, uma vez que o orçamento da União prevê deficit de R$ 170 bilhões neste ano e de quase R$ 140 bilhões em 2017.

Além de beneficiar os consumidor­es, a criação de planos individuai­s populares daria novo gás às operadoras de saúde, sufocadas por leis que engessam e encarecem os os custos do setor.

Em 2015, a margem operaciona­l das empresas foi de 0,5% —só o terceiro balanço positivo em nove anos. Fora a crise, o setor convive com uma política irrealista da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementa­r), que autoriza reajuste sempre abaixo da variação dos custos.

Desde 2007, os planos subiram 115%, enquanto as despesas aumentaram 228% (quase o dobro). O resultado é que raras empresas oferecem planos individuai­s novos, prejudican­do quem gostaria de contratá-los.

As operadoras estão sujeitas ainda a uma crescente e exagerada demanda por exames, tanto de médicos quanto de pacientes, sem falar das fraudes. É preciso reduzir custos para que possam oferecer produtos mais atraentes e acessíveis.

Por fim, admitimos que o setor apresenta falhas na relação com os clientes. Contudo, ao contrário do que se propala, nossas empresas não figuram entre as mais reclamadas. Dados do próprio Sistema Nacional de Informaçõe­s de Defesa do Consumidor comprovam: ao compilar dados dos procons, registra que, no ranking de reclamaçõe­s, os planos de saúde ocupam o 18º lugar.

Entidades com acolhida na mídia, entretanto, vendem um falso discurso de que eles maltratam o cliente. Há empresas boas e ruins, cabendo divulgar as primeiras e punir, duramente, as últimas.

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