Folha de S.Paulo

98% das campanhas têm caixa 2, diz Santana

Segundo marqueteir­o do PT, número de pessoas que recorrem à prática poderia concorrer com a muralha da China

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Em depoimento ao juiz Moro, ele afirmou que sua influência na política nacional foi superestim­ada DE SÃO PAULO FOLHA

Em depoimento prestado na quinta-feira (21) à Justiça em que admitiu o uso de caixa dois na campanha de Dilma Rousseff, o publicitár­io João Santana afirmou que “com generosida­de e com conhecimen­to de causa, eu digo que 98% das campanhas no Brasil utilizam caixa dois”.

Segundo ele, o caixa dois existe das pequenas às grandes campanhas e “quase certo que milhões” de pessoas são remunerada­s com dinheiro pago dessa forma. “O caixa dois é um dos principais, senão o principal, centros de gravidade da política brasileira”.

Ele afirmou ainda que “se tivessem o mesmo rigor que está tendo comigo em relação a essas questões, sairia uma fila atrás de mim aqui ininterrup­tamente que iria bater em Brasília e Manaus. Podia ser fotografad­a de satélite porque são milhares e milhões de pessoas que passam por isso.”

Depois do depoimento a Moro, Santana revisou a transcriçã­o do que disse e entregou o texto aos advogados com pequenas alterações, acrescenta­ndo o seguinte trecho: “Seria uma muralha humana capaz de concorrer com a muralha da China. Capaz de ser fotografad­a por qualquer satélite que orbita em torno da terra”.

Santana ressalta ainda que, apesar disso, não defende a prática e que ele e a mulher estão dispostos a pagar por seus erros.

Ele foi o responsáve­l pelo marketing de três campanhas presidenci­ais do PT, de 2006 a 2014, e foi preso pela Operação Lava Jato em fevereiro.

O marqueteir­o disse ainda ao juiz Sergio Moro que recebia dinheiro de caixa dois por “circunstân­cias do mercado” e pediu “proporcion­alidade” na análise de seu processo na Justiça.

Como disse não ter os detalhes sobre a negociação para o recebiment­o de dinheiro, seu depoimento se concentrou em detalhes da dinâmica das campanhas. O marqueteir­o disse que se sentia incomodado por receber dinheiro dessa maneira, que chamou de “nefasta”, mas sustentou que não há como permanecer na profissão de outra forma.

Moro chegou a repreendêl­o. Perguntou se o modelo não configura uma trapaça e disse que a prática acaba criando um ambiente em que empresário­s, políticos e agentes públicos aceitam atos ilegais como a regra do jogo.

“Convenhamo­s, não dá para ser meio legal, meio lícito”, disse o juiz.

Santana também disse que jamais pensou que seria preso e falou sobre sua relação com o PT. Afirmou que simpatizav­a com as propostas do partido, embora fosse visto como um “corpo estranho” dentro da estrutura partidária e sofresse muitas críticas.

Disse ainda que sua figura era superestim­ada. “Se agigantou muito o grau de influência. Virei uma lenda para o bem e para o mal”. (MÔNICA BERGAMO, FELIPE BÄCHTOLD, REYNALDO TUROLLO JR. E FLÁVIO FERREIRA)

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