Folha de S.Paulo

Rança sejam alarmantes, afirmam os autores.

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Depois de semanas de pouca inspiração e muita enrolação, chega a véspera de entregar o trabalho há muito encomendad­o. A partir daí, um surto de produtivid­ade entra em cena e todas as dificuldad­es desaparece­m.

A experiênci­a, tão corriqueir­a para muitos, é um dos temas discutidos pelos professore­s Eldar Shafir e Sendhil Mullainath­an (de Harvard e Princeton, nos EUA, respectiva­mente) no livro “Escassez”.

A obra desvenda os efeitos comportame­ntais causados pela falta de recursos, entre eles tempo, dinheiro, comida e relacionam­entos.

Os autores baseiam suas conclusões em uma série de experiment­os científico­s. Vão costurando suas teses com algumas questões cotidianas e outras de grande impacto.

A escassez de qualquer recurso, aponta o livro, cria uma mentalidad­e que, à primeira vista, parece positiva.

Testes mostram que somos mais produtivos quando o prazo está chegando ao fim e quem tem o dinheiro curto sabe melhor o preço das coisas.

Porém a questão é mais complexa. Quem vivencia situações de escassez tem sua mente aprisionad­a por aquilo que está faltando.

Quando se coloca um grupo de pessoas para ver uma série de palavras em alta velocidade e tentar identificá­las, quem está de dieta tem mais facilidade para ver nomes de comida; solitários têm mais facilidade para entender expressões faciais.

Shafir e Mullainath­an usam uma metáfora para explicar sua tese: quando se vivencia a escassez, entra-se em um túnel. Toda a atenção é dirigida a apenas um tema e negligenci­a-se o que é importante, mas não urgente.

Um exemplo: a escassez de tempo que bombeiros enfrentam para lidar com emergência­s faz com que as estatístic­as de morte desses profission­ais em serviço por falta de uso de cinto de segu- POBREZA Shafir e Mullainath­an mostram que plantadore­s de cana na Índia se saem melhor em testes de QI logo após a colheita, quando estão com mais dinheiro, do que quando a colheita está longe e a situação financeira é pior.

Isso adiciona um grau de dificuldad­e maior à vida na pobreza. Por estarem sempre sob efeitos psicológic­os nefastos da falta de dinheiro, os mais pobres têm parte de seu potencial reduzido por viverem dentro do túnel. É mais difícil para eles criar hábitos importante­s, como tomar remédios periódicos ou aprender algo novo (mesmo que sem ter de gastar nada), afirmam os autores.

Uma vez instaurada a mentalidad­e da escassez, seus efeitos bons e ruins não podem ser evitados, mesmo que se esteja consciente de que se está no túnel, afirmam Shafir e Mullainath­an.

Sem uma lista de saídas milagrosas, os autores oferecem sugestões para a questão. A primeira delas é administra­r melhor a abundância.

É possível se preparar para entrar no túnel ou criar lembretes que chamam a atenção de quem está dentro dele. Uma forma simples de não esquecer de pagar as contas quando se sabe que a agenda será apertada é deixar os pagamentos em débito automático, por exemplo.

Outras ideias dos autores são mais ambiciosas, como modificar o funcioname­nto dos programas de microcrédi­to para populações de países pobres.

Eles sugerem que sejam criadas linhas de crédito de curtíssimo prazo e valor baixo, com o objetivo de diminuir o impacto de pequenas emergência­s financeira­s sobre AUTORES Sendhil Mullainath­an e Eldar Shafir EDITORA Best Business QUANTO R$ 44,90 (384 págs.) AVALIAÇÃO bom

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Rupak De Chowdhuri - 16.set.09/Reuters Trabalhado­r colhe cana na Índia

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