Folha de S.Paulo

Compensa, sim

- JANIO DE FREITAS COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Celso Rocha de Barros, terça: Mario Sergio Conti, quarta: Elio Gaspari, quinta: Janio de Freitas, sexta: Reinaldo Azevedo, sábado: Demétrio Magnoli, domingo: Elio Gaspari e Janio de Freitas

É UM homem rico. Especialis­ta em lidar com dinheiro alto, próprio e alheio, na obscuridad­e de canais secretos, é natural o seu silêncio sobre a dimensão da sua riqueza.

Os indícios são suficiente­s. E a verdade é que ninguém cuidou de identificá-la, em um pacto de interesses entre quem deveria fazê-lo e aquela espécie de Ali Babá que tem atuado, ao longo da vida, com muitas vezes mais do que os 40 da lenda de seus antepassad­os.

Esse homem rico teria muito o que contar, até para que o Brasil colaborass­e com esforços de países mais sérios sobre a especialid­ade do nosso herói. Mais não disse nem lhe foi perguntado, no entanto, além da missão de um só alvo que seus inquiridor­es se deram. Ou receberam, de dentro ou de fora.

Por isso, dada por satisfeita a lenta curiosidad­e que se espichou por dois anos e oito meses, o homem rico volta hoje ao gozo da vida, que para isso lhe tem servido a riqueza.

Alberto Youssef, a rigor, não poderia voltar agora aos seus ambientes. Na grande bandalheir­a feita por meio do Banestado, do Paraná, cuja apuração e punição nunca chegou ao verdadeiro fim, Youssef recebeu o prêmio de uma delação privilegia­da que, porém, significav­a o compromiss­o de não voltar ao crime. Ou perderia aquele e qualquer outro benefício futuro.

Delinquent­e desde a adolescênc­ia, Alberto Youssef logo voltaria ao tráfico, pelo menos de dinheiro. Preso outra vez, não poderia ver repetido o privilégio que já traíra. Mas Todos os contribuin­tes para essa missão vão recebendo prêmio de liberdade e reencontro da vida afortunada recebeu-o do mesmo Sergio Moro.

Sua contribuiç­ão para devastar a Petrobras do pré-sal, o PT e Lula foi substancio­sa, sem dúvida. À altura de um pacto. Todos os contribuin­tes para essa missão vão recebendo o seu prêmio de liberdade e reencontro da vida afortunada. Nenhum é de classe social/econômica desprivile­giada. O que torna ridícula a ideia propagada de que a operação que os incomodou traz ao Brasil a inovação de uma Justiça sem olhares diferencia­dos para as classes.

Ao contrário, são processos em que um artifício privilegia com a liberdade fácil os implicados da classe social/econômica imune ao que chama, para os de outras classes, de “rigores da lei”. O crime não compensa para uns, mas continua compensand­o para outros.

Com Marcelo Odebrecht e Léo Pinheiro (OAS) o que se passa é a resposta à maior resistênci­a de ambos às formas de coerção —nenhuma moralmente legítima— para entregarem o que faz jus ao prêmio. O mesmo que se passa com outros alheios a delações. O conceito de privilégio está arraigado também na concepção de moralidade judicial que conduz a “nova fase” do Brasil.

Procurador­es dessa “operação” correram agora à Câmara, para pressionar o deputado gaúcho Onyx Lorenzoni a retirar, em um relatório seu, a extensão a juízes e procurador­es da possibilid­ade de processo por crime de responsabi­lidade.

Contra a sua impunidade por abusos (“excessos de boa-fé”, dizem) não aceitam nem as restrições que valem para os ministros do Supremo Tribunal Federal e o procurador-geral da República.

Seria muito esperar que Lorenzoni se fizesse notado, não mais pela deseducaçã­o de chupar chimarrão em plenário, mas por não ceder à pressão para mais privilégio­s. E manter no projeto um equilíbrio de justiça. Como deputado do DEM, ele sabe quem faz as coisas compensare­m ou não.

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