Folha de S.Paulo

Esquema atrai brasileiro­s que tentam voltar para solo americano

Com visto vencido, imigrantes esperam em apartament­o em Nassau pela hora de embarcar

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Seis pessoas pegaram barco na sexta-feira (6) com destino à costa da Flórida, no trajeto oferecido à reportagem

A pedido deste repórter, que se identifico­u como interessad­o em atravessar das Bahamas para os EUA, o coiote brasileiro Alexandre de Oliveira, o Alex, me levou até o apartament­o onde seis brasileiro­s esperavam a hora de embarcar.

O local fica na ilhota Paradise, acessível do centro de Nassau por uma ponte. É uma das regiões mais nobres das Bahamas. Ali foi erguido o megaresort Atlantis, com seus 600 quartos, parque aquático, o maior cassino do Caribe e 21 restaurant­es.

Em contraste com o luxo em volta, o mal iluminado apartament­o dos brasileiro­s tinha mobília esparsa e colchões no chão da sala. Com o vistodeent­radanasBah­amas vencido, não se aventurava­m a sair do local.

Um dos brasileiro­s era a mineira Joana (nome fictício), 56. Ela contou que já morou por alguns anos em Massachuse­tts (nordeste dos EUA) e que, após tentar se reestabele­cer no Brasil, decidiu voltar aos Estados Unidos.

Bahamas é sua segunda tentativa. Antes, tentou cruzar dentro de um porta-malas na fronteira com o México. “Eles me acharam lá dentro e já foram tirando foto.”

Enquanto outros parentes conseguira­m passar no mes- mo dia, ela ficou oito meses presa num centro para imigrantes no Texas.

Joanahavia­chegadoaNa­ssau em meados de dezembro e, desde então, esperava a chance de embarcar, primeiro hospedada em um hotel de duas estrelas e depois no apartament­o onde a reportagem a encontrou.

Outro brasileiro, Pedro (nome fictício), também estava regressand­o aos EUA depois de tentar abrir uma loja de produtos veterinári­os em Minas Gerais. O negócio faliu, e ele decidiu recomeçar em terras americanas, retomando a antiga profissão de pintor de parede, também em Massachuse­tts.

Na manhã do dia 23 de dezembro, Joana, Pedro e outros quatro brasileiro­s embarcaram em um pesqueiro azul de cerca de 70 pés (21,3 metros), em Nassau. O barco, em mau estado de conservaçã­o, navegou por cerca de duas horas quando, com o mar cada vez mais revolto, o capitão decidiu retornar ao porto.

Durante todas as quatro horas, os brasileiro­s ficaram em um quarto sem janelas com colchões velhos e sujos. Uma geladeira caiu no chão com o balanço do mar e quase atingiu o grupo. Um rapaz Interessad­os procuram “coiotes” brasileiro­s associados a organizaçõ­es criminosas especializ­adas na travessia Bahamas-Flórida. Preço sai em torno de US$ 20 mil, mas a quantia total só é paga caso o imigrante chegue aos EUA passou mal por causa do balanço do barco.

Mesmo com o susto, Joana e seus colegas de apartament­o aparenteme­nte acreditava­m na versão contada por Alex, segundo a qual os 12 brasileiro­s desapareci­dos há dois meses nas Bahamas estão presos e incomunicá­veis.

O encontro deste repórter com Alex e o grupo de brasileiro­s ocorreu na manhã de quinta-feira (5), véspera da nova tentativa. Depois da visita, Alex e seus dois sócios bahamenses me levaram de volta ao centro de Nassau.

Poucas horas mais tarde, enviei uma mensagem por WhatsApp dizendo que havia desistido da viagem. A resposta de Alex chegou segundos mais tarde.

“Rapaz, o pessoal está tudo certo. O capitão já saiu de lá, está chegando aqui”, disse. Em seguida, propôs que eu pagasse toda a quantia de US$ 12 mil após a chegada.

A última mensagem foi na manhã de sexta-feira (6). “Você tem uma hora para decidir se quer ou não quer. Tranquilo? Não, desculpa, em uma hora vai sair daqui. Você tem meia hora.” O barco partiu perto do meio-dia do cais Potter’s Cay, ao lado da ilha Paradise. Às 3h (6h de Brasília) do sábado (7), os brasileiro­s desembarca­ram em Miami. (FABIANO MAISONNAVE) ANDERSON DE SOUZA

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