ANÁLISE País será menos prejudicado que outros por protecionismo
FOLHA
Donald Trump inaugura um período de incertezas para o Brasil. Não tanto pela retórica bombástica ou pelo flerte irresponsável com o protecionismo. Afinal, o novo presidente não é um ideólogo, mas um negociador que usa ameaças e intimidação para arrancar aquilo que quer de seus interlocutores.
O problema são os potenciais efeitos não-intencionais desse estilo presidencial. Mesmo sem querer, Trump pode dar ainda mais força à onda populista na Europa, induzir um choque comercial descontrolado com a China ou empurrar o México para o precipício, todas coisas ruins para o Brasil.
O país, no entanto, deve ser menos prejudicado do que outros países. Como exportamos poucos manufaturados para os Estados Unidos, o aumento de barreiras nos machuca menos.
Tampouco há grandes questões pendentes: o malestar da espionagem foi esquecido, e a imigração brasileira para os Estados Unidos não figura no radar.
Por esses motivos, o governo Temer quer lidar com Trump por meio de uma agenda de resultados econômicos. O desafio é mostrar à nova equipe em Washington que há oportunidades de ganho concreto.
O cardápio de opções é vasto. A área mais evidente é a indústria de defesa e segurança. Existe no Brasil consenso a respeito da necessidade de assinar um acordo de salvaguardas com os Estados Unidos que permita reativar a base de lançamentos de foguetes em Alcântara (MA). Há interesse mútuo em consolidar a cooperação iniciada entre Polícia Federal e FBI durante a Copa e as Olimpíadas.
E o setor privado tem o que mostrar. Boeing e Embraer trabalham juntas com êxito. A Braskem acaba de abrir uma fábrica no Texas.
Onde há pouca chance de avanço é na área de bitributação, que onera a relação bilateral. Aí, seria necessário um esforço coordenado entre Trump e Temer para eliminar resistências. As chances disso acontecer, contudo, são pequenas. CONGRESSO Seja como for, operar a nova Washington de Trump demandará do Brasil competências e habilidades nas quais sempre fomos mal.
Uma delas é o trabalho de influência junto ao Congresso americano, onde têm representação os interesses econômicos mais fundamentais. Falta interlocução de alto nível e promoção eficiente da marca Brasil.
Outra é o trabalho de lobby de agentes privados brasileiros na capital americana.
O esforço que existe hoje é valioso, mas ainda quase minúsculo quando comparado ao de países bem menores e mais pobres. É o tipo de coisa que é fácil de reverter, pois há modelos bons para a gente se inspirar.