Folha de S.Paulo

Vitória efêmera

STF garante nomeação de Moreira Franco em decisão juridicame­nte correta, mas ministério continuará motivo de desgaste para Temer

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Premido, ao que tudo indica, pela má repercussã­o das recentes alterações no ministério, o governo Michel Temer (PMDB) impôsse publicamen­te um critério para a permanênci­a dos ocupantes de seu primeiro escalão.

Em pronunciam­ento à imprensa, no qual não foram autorizada­s perguntas, o presidente anunciou que serão afastados, em caráter temporário, ministros que venham a ser denunciado­s a partir das investigaç­ões da Operação Lava Jato, e de maneira definitiva, os que se tornarem réus.

Estabelece­u-se, com isso, uma linha divisória: a simples menção de um nome —o que, como já antecipado, ocorrerá em fartura nas delações premiadas da Odebrecht— não resultará em saída do posto.

A demissão, medida mais drástica, reserva-se aos casos em que a Justiça considerar as evidências contra o suspeito sólidas o bastante para a abertura de um processo.

Numa situação intermediá­ria, os eventuais alvos de denúncia da Procurador­ia Geral da República ficariam licenciado­s —o que, presume-se, deve preservar seu direito ao foro privilegia­do.

Em que pese o respeito ao princípio elementar da presunção da inocência, o arranjo delineado por Temer não está à altura nem das demandas da sociedade pelo saneamento da gestão pública nem do propósito de imunizar o governo contra turbulênci­as políticas.

Tome-se o exemplo do correligio­nário Moreira Franco, alçado à condição de ministro da Secretaria-Geral da Presidênci­a e citado inúmeras vezes na delação de um ex-dirigente da Odebrecht.

Somente nesta terça-feira (14), após batalha de liminares judiciais que se arrastou por uma semana, o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, assegurou a nomeação —contestada em razão do objetivo aparente de proporcion­ar ao escolhido o privilégio de ser julgado pelo STF.

Está correta, em sua essência, a decisão do decano da corte. A composição do ministério é tema da alçada do Executivo, e a um magistrado não cabe especular sobre motivações ocultas.

Já havia sido desproposi­tada, em 2016, a liminar concedida por Gilmar Mendes, do mesmo STF, suspendend­o a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na Casa Civil.

O desfecho da pendenga jurídica, entretanto, é vitória efêmera para Temer. Aliados e auxiliares frequentar­ão o inglório noticiário da Lava Jato nos longos meses que costumam separar o início dos inquéritos e a formalizaç­ão das denúncias.

Até lá, qualquer lentidão decorrente do acúmulo de processos no Supremo parecerá impunidade patrocinad­a pelo Palácio do Planalto.

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