Folha de S.Paulo

Rússia é acusada de violar acordo militar

No mesmo dia em que assessor cai por relação com russos, relato sobre mísseis coloca mais pressão sobre Trump

- IGOR GIELOW

De acordo com acusação, Moscou teria tornado operaciona­l um míssil proibido desde 1987; Kremlin não comentou

No mesmo dia em que o conselheir­o Michael Flynn caiu pelas conversas com o embaixador russo nos EUA, autoridade­s americanas disseram que Moscou rompeu um importante tratado de controle de armas ao tornar operaciona­l um míssil proibido desde 1987.

Com isso, Trump será pressionad­o a lidar com a questão, sobre a qual Barack Obama apenas protocolou protestos formais quando identifico­u testes com um míssil de cruzeiro lançado por terra em 2014, evitando um embate direto com Moscou.

Citando fontes anônimas do governo, o jornal “The New York Times” publicou nesta terça (14) que a Rússia desenvolve­u o modelo testado naquele ano e possui dois batalhões da arma. O Kremlin, que negou a acusação de 2014, não comentou a publicação.

Um dos principais acordos que marcaram o fim da Guerra Fria entre Estados Unidos e União Soviética, o INF (sigla inglesa para Tratado de Forças Nucleares de Alcance Intermediá­rio), baniu esse tipo de míssil com alcance entre 500 km e 5.500 km.

Famoso durante a primeira Guerra do Golfo (1991), o míssil de cruzeiro tem este nome por voar com velocidade constante, seguindo o terreno por meio de sensores.

De difícil detecção por radar por voar em altitudes tão baixas quanto 30 ou 50 metros, além de ser lançado de carretas extremamen­te móveis e furtivas, o míssil era visto como uma grande ameaça para o eventual primeiro ataque nuclear entre as então superpotên­cias.

Ao todo, cerca de 800 unidades americanas e 1.800 soviéticas foram desmantela­das até 1991, segundo estimativa­s da Federação de Cientistas Americanos, entidade referência no tema.

Chamado pelos america- nos de SSC-X-8, ninguém sabe exatamente de qual míssil o novo modelo russo se trata, embora sejam uma evolução natural da família dos antigos RK-55 soviéticos.

Do ponto de vista militar, a arma poderia significar um desperdíci­o de recursos. Moscou testou com sucesso na intervençã­o russa na Síria variantes navais e lançadas por aviões dos mísseis.

Preocupado basicament­e com o cenário dos anos 1980, que via um conflito terrestre europeu, o INF não proíbe tais versões dos mísseis.

Com um alcance médio estimado em 2.000 km, os modelos já operaciona­is podem ser usados contra quaisquer alvos que a Rússia quiser na Europa, Oriente Médio ou Ásia, levando à dúvida se seria feito tal investimen­to no modelo lançado por terra.

Em favor da versão publicada, o modelo terrestre usa um lançador muito semelhante ao utilizado com o míssil balístico Iskander-K, que é permitido por tratados.

Logo, grandes números da arma eventualme­nte poderiam ser disfarçado­s em locais como Kaliningra­do, o encrave russo mais próximo da Europa, que Moscou vem reforçando ao longo dos anos.

A relação entre Trump e o governo de Putin é um dos principais pontos de fricção para o novo presidente americano. Identifica­do com o russo pela empatia mútua, há a dúvida se o americano vai suspender as sanções contra Moscou devido à guerra na Ucrânia, exatamente o tema que derrubou Flynn.

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