Folha de S.Paulo

ANÁLISE Sem núcleo duro, presidente fica mais isolado e dependente

- IGOR GIELOW

A licença de Eliseu Padilha do núcleo duro do governo, ao menos neste momento, aumenta o isolamento do presidente Michel Temer e sua dependênci­a do PMDB da Câmara e do PSDB para tocar o restante de seu mandato.

A saída de Padilha, em que pese problemas de saúde, ocorre justamente quando a Procurador­ia-Geral da República preparava ação contra o ministro —episódio que obrigou o próprio Temer a reafirmar que só pediu dinheiro legal à Odebrecht, de resto uma defesa padrão entre acusados no petrolão.

Ao montar seu governo, ainda interino, Temer cercouse de auxiliares que o acompanhav­am há décadas no PMDB. O quarteto Romero Jucá (Planejamen­to), Padilha (Casa Civil), Geddel Vieira Lima (Secretaria de Governo) e Moreira Franco (hoje na Secretaria-Geral) formava a rede de aconselham­ento e operação do presidente.

Hoje, no Planalto, só sobrou Moreira Franco. Os outros foram abatidos por escândalos éticos, agravados, no caso de Padilha, pela questão da saúde. Jucá continua poderoso, como líder no Senado, mas nominalmen­te Temer está sozinho.

Ganha peso o PMDB da Câmara, que vinha se sentindo alijado do centro do poder. Com a no mínimo polêmica, para ficar no eufemismo, indicação do deputado Osmar Serraglio (PR) para a Justiça, o grupo ganha influência sobre a sensível área relacionad­a ao controle da Polícia Federal.

Isso não significa controle para parar a Lava Jato automatica­mente. A operação tem vida própria e instâncias variadas, e qualquer tentativa mais óbvia sob a alçada do Ministério da Justiça, como o remanejame­nto de delegados, será imediatame­nte percebida e amplificad­a.

O que não quer dizer que não possa vir a ocorrer, naturalmen­te, apesar do fato de que Serraglio terá de adotar o figurino da “mulher de César” se não quiser enfrentar uma crise por dia dado seu envolvimen­to pretérito com o político preso mais famoso da Lava Jato, o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Outro flanco afetado pela licença de Padilha é o PSDB. O partido já havia se instalado no núcleo duro com a chegada do deputado federal Antonio Imbassahy (BA) à Secretaria de Governo, e o senador Aécio Neves (MG), presidente, vinha tratando publicamen­te de indicações de nomes nas últimas semanas.

Em tese, Temer fica mais dependente dos tucanos, mas a saída de José Serra do Itamaraty, anunciada na quarta (22), jogou sombras sobre a situação do aliado de primeira hora. Sem Serra, Aécio perde seu principal homem no governo: a dupla era fiadora da aliança PSDB-PMDB, sob pressão do adversário interno Geraldo Alckmin (SP), que disputa com Aécio a vaga de presidenci­ável em 2018.

A partida será jogada no Congresso, onde Temer tem uma ampla agenda que inclui as reformas previdenci­ária e trabalhist­a. Isso se as novidades da Lava Jato não vierem a paralisar de vez o processo legislativ­o.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil