Folha de S.Paulo

Ao barrar imprensa, Casa Branca se torna Trump Tower

- CLÓVIS ROSSI

FOLHA

Desde que Donald Trump foi eleito, discutiu-se muito nos Estados Unidos sobre os possíveis conflitos de interesse entre seus negócios particular­es e sua função pública.

Nesta sexta (24), deu-se na prática uma demonstraç­ão de que Trump é incapaz de distinguir entre coisa pública e interesses privados: transformo­u a Casa Branca em uma “Trump Tower”, ao vetar a participaç­ão da CNN, do sítio “Politico” e do “New York Times” em um briefing de seu porta-voz, Sean Spicer.

A Casa Branca não pertence a Trump. É, como está explicitad­o no escudo, o escritório do presidente dos Estados Unidos. Portanto, a ela tem obrigatori­amente acesso todos os que cumprem o requisito legal para aceder à sede do governo.

No caso dos jornalista­s, o processo de credenciam­ento segue critérios rigorosos, e todos os que o superam estão habilitado­s a participar dos eventos jornalísti­cos. É do interesse público, como diz, por exemplo, Dean Baquet, editor-executivo do “New York Times” a propósito do incidente: “O acesso livre da mídia a um governo transparen­te é obviamente de crucial interesse nacional.” Só não é do interesse de Trump, que, como todo líder autoritári­o, odeia qualquer tipo de crítica ou notícia desfavoráv­el.

Nunca é bom esquecer que a qualificaç­ão de “inimigo do povo”, mais de uma vez aplicada por Trump a alguns setores da mídia, é um eco do nazismo. Os judeus, para ficar em um só exemplo, eram chamados pelo regime nazista de “inimigos do povo”, pretexto para o Holocausto. Dissidente­s do regime soviético também recebiam tal rótulo —e, não raro, acabavam em campos de concentraç­ão.

Parece difícil que Trump chegue a tais extremos, mas o simples uso dessa sinistra expressão indica o seu caráter autoritári­o, para não dizer ditatorial.

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