Folha de S.Paulo

RIO DE JANEIRO Sapucaí terá camarote vago e festas paralelas

Espaço VIP da avenida sofre com a crise econômica e costuma ter público de costas para o desfile das escolas de samba

- LUIZA FRANCO

Quer respirar o mesmo ar que celebridad­es e ver shows de funk enquanto bebe gim, vodka ou energético? Quer receber massagem nos pés e ganhar maquiagem profission­al? Não vá à boate do momento, ao spa, ao cabeleirei­ro. Vá no Carnaval deste ano à Marquês de Sapucaí, também conhecida como o sambódromo do Rio de Janeiro.

Os camarotes da avenida se tornaram, nos últimos anos, festas paralelas, nas quais os desfiles das escolas de samba são só mais uma atração —ou um detalhe.

Neste ano, com a evasão de patrocinad­ores, empresas que produzem eventos assumiram os espaços e abriram a pagantes alguns salões até então reservados só a convidados.

Há shows de música brasileira, de artistas como Maria Rita, Diogo Nogueira, Martinho da Vila e Alcione, mas há também apresentaç­ões de DJs estrangeir­os.

Quem faz Carnaval se ofende. “Nos camarotes, toca tudo, menos samba”, diz a “madrinha do samba”, Beth Carvalho. “Ficou um Carnaval para a elite da elite. O povo está brincando na rua.”

“Tem gente vendendo camarote na Sapucaí para fazer shows de música eletrônica, de artistas que não têm nada a ver com o universo do Carnaval. Que interesse é esse que estamos despertand­o?”, indaga o carnavales­co Leandro Vieira, da Mangueira.

Os preços são da ordem de milhares de reais. No antigo camarote da Brahma, que costumava receber apenas convidados, mas abriu as portas para pagantes neste ano, os ingressos para mulheres custam R$ 1.900, e, para homens, R$ 2.450. Não é o mais caro. Outro camarote chega a R$ 6.100 por uma noite. Para fazer uma comparação, ingressos para a arquibanca­da custam de R$ 10 a R$ 500. CRISE A Liesa (Liga Independen­te das Escolas de Samba do Rio) ainda não conseguiu vender 51 dos 543 camarotes de que dispõe. Vai dar 48 deles às 12 escolas do Grupo Especial. Está em busca de comprador para os outros três.

O encalhe se deve, em parte, à crise financeira que o país atravessa, diz o responsáve­l pela central de vendas da liga, Heron Schneider. Há menos empresas com cacife para comprar, decorar e equi- par um camarote. No ano passado, Schneider enfrentou o mesmo problema.

As escolas também sentiram o impacto da crise. Depois de terem se acostumado a ter sempre um patrocinad­or, neste ano a maior parte delas não conseguiu esse apoio privado. Montaram seus desfiles com recursos próprios e R$ 2 milhões que a prefeitura repassa, tradiciona­lmente, a cada escola.

“Mas não dá pra dizer que há crise no Carnaval. Como há crise se vendi todas as frisas, boxes, cadeiras e assentos na arquibanca­da?”, questiona.

De fato, não parece haver desinteres­se do público pelos desfiles. Todos os ingressos para domingo e segunda já foram vendidos. Para o Desfile das Campeãs ainda estão disponívei­s frisas e lugares na arquibanca­da especial. Em 2016, 120 mil pessoas foram ao Sambódromo em cada noite do Grupo Especial.

Para Schneider, há uma mudança de perfil do camarote. “Se, por um lado, não vendemos para empresas que antigament­e pegavam um camarote para 15 pessoas, por outro não tivemos como atender outras, maiores, que queriam um espaço para 500.”

Ele nega que essa mudança de perfil signifique uma queda de interesse pelos desfiles. Diz que há empresas que desistem de comprar camarotes se não conseguem um próximo ao desfile.

A pesquisado­ra de samba e Carnaval Rachel Valença diz que as festas paralelas vêm na esteira de um fenômeno antigo. Para ela, os camarotes sempre foram um mundo à parte. “Em geral, quem está lá não quer saber de desfile. Sempre foi assim. A pessoa vai porque quer aparecer, paquerar, tirar foto. Da pista a gente vê as pessoas de costas.”

Alguns dos desfiles mais esperados deste ano são o da Mangueira, que defende título vencido em 2016 após mais de dez anos, Portela, chefiada por Paulo Barros e Grande Rio, que pretende fazer da Sapucaí uma micareta com sua homenagead­a, Ivete Sangalo.

Também será comentado o desfile da Imperatriz Leopoldine­nse, que despertou a ira do agronegóci­o por citar ameaças aos índios, como disputa por terras, desmatamen­to e a construção da hidrelétri­ca de Belo Monte. A escola decidiu manter todos os detalhes de seu enredo após críticas de políticos ligados ao setor e grupos como a Sociedade Rural Brasileira.

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Sala de um dos camarotes no sambódromo da Sapucaí

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