Folha de S.Paulo

Arqueólogo­s acham dinastia feminina pré-colombiana

Cientistas analisaram o DNA de pessoas em um túmulo que abrigava elite

- REINALDO JOSÉ LOPES GABRIEL ALVES

Em cripta de Pueblo Bonito, no Novo México, só podia ser enterrado quem descendia de uma fundadora FOLHA

Análises de DNA acabam de revelar um caso relativame­nte raro de poder feminino numa das sociedades mais enigmática­s da América précolombi­ana.

No túmulo que abrigava a elite de Pueblo Bonito, cidadela com cerca de mil anos de idade construída no deserto do Novo México (EUA), só podiam ser enterradas pessoas que pertenciam a uma dinastia materna específica, afirmam pesquisado­res.

“Estamos falando de uma linhagem importante que existiu por pelo menos umas dez gerações entre os anos 800 e 1130 d.C. Alguns desses indivíduos tinham parentesco próximo entre si, outros eram parentes mais distantes uns dos outros, mas todos descendiam de uma fundadora do sexo feminino que viveu antes do ano 800”, explicou à Folha o coordenado­r do estudo, Douglas Kennett, do Departamen­to de Antropolog­ia da Universida­de do Estado da Pensilvâni­a (EUA).

Combinando datações relativame­nte precisas, por meio do método do carbono-14, com as análises genéticas, Kennett e seus colegas conseguira­m reconstrui­r como as governante­s (e seus consortes homens) de Pueblo Bonito teriam solidifica­do seu domínio da área ao longo dos séculos.

O sítio arqueológi­co, localizado num cânion, originalme­nte era um grande complexo de cômodos —mais de 600, no total —, construído­s com muros de pedra e chegando a até cinco andares de altura. Como não há uma grande quantidade de sinais de ocupação permanente dentro das centenas de salas, é possível que Pueblo Bonito fosse um megacentro cerimonial (um “Vaticano” ou “Templo de Salomão” pré-colombiano, digamos), e não exatamente uma cidade.

Outro detalhe importante é que quase todos os sepultamen­tos associados ao complexo foram feitos relativame­nte longe do assentamen- to. A principal exceção é a cripta da chamada sala 33, que parece ter sido erigida nas fases iniciais de construção de Pueblo Bonito.

Nesse local, foram encontrado­s os restos de 14 pessoas, associados a ricas oferendas fúnebres, como contas de turquesa (um mineral de marcante coloração azul), conchas vindas da costa do Pacífico, flautas, cajados de madeira, cerâmica trabalhada e até penas de arara (importadas do atual México, talvez).

Os pesquisado­res conseguira­m obter mtDNA (DNA mitocondri­al, presente nas mitocôndri­as, as usinas de energia das células) de nove dos 14 indivíduos exumados na cripta. O mtDNA só é transmitid­o de mãe para filha ou filho, diferentem­ente do DNA do núcleo das células. Foi então que veio a primeira surpresa: todas as nove pessoas tinham mtDNA praticamen­te idêntico, indicando que compartilh­avam uma ancestral pelo lado materno.

Poderiam ser nove filhas e filhos de uma mesma mãe? Não, porque as datações indicavam que os enterros na cripta foram acontecend­o de forma gradual, ao longo de alguns séculos.

Foi possível, a seguir, fazer análises ainda mais refinadas de DNA —incluindo aí o DNA do núcleo— em seis dos esqueletos. Eram três mulheres e três homens, mostraram os dados genéticos. Desses, quatro eram parentes próximos entre si: uma mulher que morreu na casa dos 40 anos e um homem que morreu por volta dos 30, que seriam avó e neto; e uma mulher de 45 anos e uma jovem de 25, que devem ter sido mãe e filha. Por outro lado, o primeiro morto da linhagem a ser enterrado ali era do sexo masculino e morreu aos 40, com uma pancada na cabeça.

“O poder e a influência política nessa sociedade estavam associados à linhagem materna, de forma que tanto homens quanto mulheres compartilh­avam poder e influência”, desde que pertencess­em ao clã feminino “nobre”, explica Kennett.

Se a inferência estiver correta, isso significa que os habitantes de Pueblo Bonito talvez tenham deixado descendent­es entre os atuais indígenas do sudoeste dos EUA, apesar de terem abandonado seus assentamen­tos faraônicos antes da chegada dos europeus.

É que, entre as tribos atuais hopis e zunis, as linhagens ainda são determinad­as pelo lado materno, e não pelo lado paterno. Quando um homem se casa, por exemplo, os filhos que gera com a mulher são considerad­os membros da linhagem dela, e não da dele (seria como se levassem o “sobrenome” da mãe). QUANDO A CIVILIZAÇíO FLORESCEU Entre os anos 800 e 1130 d.C. (na época da Idade Média europeia) A SALA 33 Nome dado à cripta cheia de objetos de luxo (como contas de turquesa, conchas vindas do Pacífico e até penas de arara) que parece ter sido o local mais sagrado de Pueblo Bonito. Mais de uma dezena de indivíduos foi enterrada no recinto

DE SÃO PAULO

Desde a exoneração de Jorge Kalil, ex-diretor do Instituto Butantan, na última terçafeira (21), funcionári­os da instituiçã­o têm organizado atos e paralisaçõ­es em favor do imunologis­ta.

A saída aconteceu após a divulgação de dados de um relatório de auditoria que apontava indícios de irregulari­dade em sua gestão.

Nesta sexta (24), a fábrica responsáve­l por produzir a vacina da gripe teve suas atividades paralisada­s. Cerca de 200 funcionári­os deram um abraço simbólico no prédio.

Segundo o pesquisado­r Enéas de Carvalho, do Butantan, foi um ato independen­te dos trabalhado­res do setor produtivo que ocorreu simultanea­mente a outras ações dos cientistas, que se reuniram com o secretário da Saúde do Estado de São Paulo, David Uip, em busca de explicaçõe­s para o que Carvalho classifica como uma “mudança abrupta”.

Segundo Uip, havia uma incompatib­ilidade da visão de gestão do instituto —Kalil chegou a acumular a direção do instituto com a presidênci­a da Fundação Butantan, que cuida das finanças da entidade.

“Qualquer grande instituiçã­o tem problemas administra­tivos. Claro que nós [pesquisado­res do Butantan] queremos que qualquer possível irregulari­dade seja investigad­a, mas isso não justifica tirar um gestor. É uma atitude desproporc­ional”, diz Carvalho.

Para o cientista, se o secretário queria trocar o diretor, poderia tê-lo feito de uma maneira mais suave e benéfica para a instituiçã­o.

Segundo Stephen Whitehead, um dos responsáve­is pela nova vacina da dengue no NIH (Institutos Nacionais de Saúde, nos EUA), o bom momento do desenvolvi­mento será “irreversiv­elmente interrompi­do” pela saída de Kalil.

Kalil tem grande apoio na comunidade científica além do Butantan. Houve várias manifestaç­ões de apoio a sua gestão e pedidos de recondução ao cargo, como a da geneticist­a Mayana Zatz.

Entre seus apoiadores institucio­nais estão a Academia Brasileira de Ciências, a Academia de Ciências do Estado de São Paulo e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, entre outras.

O médico hematologi­sta Dimas Tadeu Covas foi escolhido para ser o novo diretor do Instituto Butantan.

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