A licença para o corte e manejo
Restaram menos de 3% da floresta com araucárias, árvore típica do Sul do Brasil, que cobria quase metade do território paranaense. De tronco grosso e reto, com alto valor madeireiro, a árvore que integra a mata atlântica está ameaçada de extinção —mas uma pesquisa defende que cortar algumas delas pode ser uma forma de preservá-las.
Há um ano, pesquisadores da Unicentro (Universidade Estadual do Centro-Oeste do Paraná) receberam uma autorização para cortar araucárias numa pesquisa em pequenas propriedades rurais. O objetivo é desenvolver um modelo de manejo sustentável, que plante novas espécies a cada árvore retirada e conserve a floresta pelo uso.
“Botar uma cerca no que sobrou não resolveu; isso é um fato. Nós queremos gerar alternativas”, diz o professor Afonso Figueiredo Filho, doutor em engenharia florestal e coordenador do projeto.
Para ele, a floresta só vai ser preservada se tiver valor —e, com as atuais políticas de preservação, ela é muito mais um passivo do que um ativo para pequenos proprietários. “Hoje, eles vão queimando pelas beiradas para fazer área de plantio. Essa é a realidade.”
A ideia é polêmica: ambientalistas se opuseram ao que classificam como um crime ambiental, já que o corte de espécies em extinção é proibido no país, e o Ministério Público fez recomendação pedindo a suspensão da licença.
A pesquisa científica na mata atlântica, segundo os promotores, “deve ter como pressuposto sua recuperação e preservação, e não a exploração comercial”.
“A ilegalidade é evidente. Voltar ao normal cortando árvores em extinção certamente não é o caminho”, diz o promotor Alexandre Gaio, que coordena o Centro de Apoio às Promotorias do Meio Ambiente no Paraná.
O governo estadual, que dá apoio ao projeto, já informou que não irá renovar as licenças —pelo menos até que haja um “entendimento comum” sobre o tema. JUSTIFICATIVA das araucárias se fundamenta em trechos da lei da mata atlântica, que estabelece “o estímulo à pesquisa e à difusão de tecnologias de manejo sustentável”.
Para os pesquisadores, que têm o apoio da Embrapa, o manejo “é a melhor forma de conservação da floresta” em pequenas propriedades.
A cada araucária retirada, dez são plantadas, além de outras espécies nativas, no que é chamado de “enriquecimento da floresta”. Por causa da ação humana, afirmam, as áreas estão degradadas, com invasão de espécies exóticas, uso da floresta como pasto e desmatamento.
“Se continuar assim, a floresta vai definhar”, defende o agrônomo Carlos Henrique Nauiack, gerente do projeto.
No total, 48 araucárias foram cortadas, no período de um ano. Outras 477 árvores foram plantadas até agora.
A madeira foi vendida em leilões públicos, e a renda, revertida para o dono da área — no caso, a aposentada Iolinda Campestrini de Mattos, 71, que usou o dinheiro para ajudar a pagar uma caminhonete ao filho. Quase 90% do imóvel, que é usado para criação de gado e plantação de uvas, é composto por florestas.
“É muito fácil jogar pedras se você não conhece a realidade”, diz o Figueiredo.
“Hoje, a sociedade se beneficia com a conservação, mas não paga por seus custos”, afirma Nauiack.
O corte das espécies está suspenso até que se obtenha nova licença ambiental. Enquanto isso, outras atividades do projeto, como incentivo à apicultura e plantação de mudas, seguem em andamento.