Folha de S.Paulo

Tiros no pé

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BRASÍLIA - Não bastasse a faca apontada para sua cabeça com o rebuliço internacio­nal causado pela Operação Carne Fraca, o presidente Temer resolveu dar tiros no pé.

A primeira concessão na reforma da Previdênci­a, com a retirada de servidores estaduais e municipais da proposta, busca virar votos no Congresso. Com esse disparo, Temer joga por terra o melhor mote da nova Previdênci­a, para além dos argumentos fiscais: acabar com privilégio­s e unificar as regras de aposentado­ria e pensões, hoje tão desiguais.

Excluir servidores dos entes federados significa poupar castas, como as de juízes e procurador­es estaduais. Também abre a porteira para a elite do funcionali­smo federal reivindica­r a mesma deferência.

Nas contas do Tesouro, o deficit nos regimes de Previdênci­a dos Estados alcançou R$ 89,6 bilhões em 2016. Pelos cálculos do TCU (Tribunal de Contas da União), se Estados e municípios fossem obrigados a honrar hoje os pagamentos de benefícios previstos para os próximos 75 anos, faltariam R$ 2,8 trilhões.

Ainda assim o Ministério da Fazenda diz que a concessão não afetará o ajuste fiscal da União. Com a decrepitud­e das contas estaduais e a pressão de governador­es por ajuda federal sempre que o caldo entorna, a justificat­iva da Fazenda não é convincent­e —embora tenha convencido mercado e empresaria­do.

Temer volta a alvejar-se quando a equipe econômica anuncia que o resultado fiscal deste ano pode estourar a meta-buraco de R$ 139 bilhões se não houver corte de gastos e aumento de tributos. Para cobrir o rombo do rombo (R$ 58,2 bilhões), sem provocar um “shutdown” (paralisaçã­o) do governo, Henrique Meirelles quer reonerar a folha de pagamento das empresas. Ou elevar alíquota de PIS/Cofins sobre combustíve­is. Ou mais IOF sobre o câmbio.

Além dos sapatos presidenci­ais, a atividade econômica cambaleant­e e a inflação recém-adestrada serão as principais vítimas desse estampido.

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